Na sequência desses e de outros escândalos, impunha-se reforçar essa independência, como forma de aumentar a transparência sobre a realidade contabilística das empresas, evitando, assim, quebras de confiança de investidores e agentes económicos, que poderiam ter, como ficou demonstrado no passado recente, impactes negativos nos mercados de capitais e na economia.
Nos Estados Unidos, o Sarbanes-Oxley Act (2002) constituiu a primeira resposta ao problema. Reforçou o regime de independência dos auditores e criou uma autoridade de supervisão pública destes profissionais, designada "public company accounting oversight board" (PCAOB).
Na UE, a Comissão apresentou, em Março de 2004, uma proposta de directiva que revia o regime da oitava directiva do direito das sociedades (Directiva n.º 84/253/CEE) - que apenas tratava autorização dos revisores oficiais de contas (ROC) - mas que pretendia regulamentar, de forma mais abrangente, a actividade de auditoria.
Embora não se tenha inspirado na iniciativa norte-americana, esta iniciativa da Comissão sempre a teve como referência, não apenas por razões cronológicas mas porque havia que criar na UE um sistema equivalente ao norte-americano que permitisse às empresas e profissionais de auditoria obter o reconhecimento das autoridades norte-americanas (PCAOB e Securities & Exchange Commission), numa base de reciprocidade, evitando, assim, custos jurídicos e económicos acrescidos para as empresas europeias. Deste modo, e embora prescrevesse um regime mais flexível do que o norte-americano, esta proposta de directiva propunha-se, ainda assim, regulamentar o registo (aprovação), autorização e reconhecimento mútuo no quadro da UE dos auditores e das sociedades de auditoria, a execução da revisão legal das contas e o controlo de qualidade das auditorias, contemplando ainda um regime sancionatório e de inspecções, bem como regras garantísticas (da independência) aplicáveis à designação, destituição dos profissionais e das sociedades de auditoria, e ainda um regime especial para as entidades de interesse público (em grande medida, integradas pelas sociedades com valores mobiliários admitidos à negociação num mercado regulamentado). Tudo articulado com um regime de reconhecimento de auditorias realizadas por auditores de terceiros países e de cooperação com autoridades de supervisão nesses países e orientado para a garantia e para o reforço da independência dos auditores.
Porém, o aspecto mais inovador desta proposta prendia-se com um dever imposto aos Estados membros de criação de um sistema de supervisão pública dos auditores e das sociedades de auditoria, gerido por uma maioria de não profissionais.
Essa proposta, depois de mais um ano de negociação, foi acordada entre o Conselho e o PE em 11 de Outubro de 2005. Após a publicação, será concedido um prazo de dois anos aos Estados membros para a respectiva transposição.
Justifica-se, assim, que se inicie atempadamente a reflexão sobre o nosso modelo de supervisão e que sejam apresentadas, até ao final deste ano de 2006, por um grupo de trabalho criado para o efeito, propostas para a transposição desta directiva, permitindo, assim, que durante o próximo ano possam ser preparados e aprovados os indispensáveis instrumentos legislativos e regulamentares.
Esta reflexão deve envolver todos os potenciais interessados e, por isso, esse grupo de trabalho deve ser integrado por representantes dos Ministérios das Finanças e da Administração Pública, da Economia e da Inovação e da Justiça, bem como por representantes das autoridades de supervisão do sector financeiro (Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e Instituto de Seguros de Portugal) e da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.
Não só a origem destas preocupações (escândalos financeiros atrás mencionados) mas o especial cuidado que deve ser posto na definição do regime das auditorias às entidades de interesse público justificam que o grupo seja coordenado pelo Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.
Deste modo:
Considerando a recente proposta de directiva comunitária relativa à revisão legal das contas individuais e consolidadas e que altera as Directivas n.os 78/660/CEE e 83/349/CEE, do Conselho;
Considerando que a mencionada directiva altera de forma significativa o enquadramento do sector de revisão legal de contas e de auditoria;
Considerando em particular que a directiva prevê, no seu capítulo IX, a criação de um sistema de supervisão pública dos revisores oficiais de contas, gerido por uma maioria de não profissionais e que assume a responsabilidade final pela supervisão do sector;
Considerando que os trabalhos de transposição da directiva para o ordenamento jurídico nacional devem ser objecto de participação dos ministérios com competências no sector, das autoridades de supervisão do sector financeiro e de associações representativas de profissionais do sector;
Considerando o meu despacho de 9 de Janeiro de 2006 que cria o grupo de trabalho de acompanhamento permanente (GTAP) da preparação dos diplomas de transposição das directivas em vigor no sector financeiro, justificando-se um enquadramento específico para a directiva da auditoria:
Determino o seguinte:
1 - É criado o grupo de trabalho de transposição da directiva da auditoria (GTTDA), que prepara os diplomas de transposição da directiva da auditoria e assegura o cumprimento do prazo de transposição da directiva.
2 - O GTTDA é coordenado pelo Secretário de Estado do Tesouro e Finanças.
3 - Integram o GTTDA:
a) A Dr.ª Rita Pereira da Silva, em representação do Ministério das Finanças e da Administração Pública;
b) Um representante do Banco de Portugal;
c) Um representante da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários;
d) Um representante do Instituto de Seguros de Portugal;
e) Um representante da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.
4 - A actividade do GTTDA deve ser articulada com outras alterações legislativas em curso nos Ministérios da Justiça e da Economia e da Inovação.
5 - O GTTDA deve apresentar uma primeira proposta de diploma de transposição da directiva até 30 de Junho de 2006.
Dê-se conhecimento do presente despacho ao governador do Banco de Portugal, ao presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, ao presidente do Instituto de Seguros de Portugal e ao bastonário da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, bem como ao embaixador da Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia.
25 de Janeiro de 2006. - O Ministro de Estado e das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos.