Resolução do Conselho de Ministros n.º 143/2005
O Programa do XVII Governo Constitucional reconhece o papel decisivo das cidades no desenvolvimento das sociedades contemporâneas e a complexidade dos desafios associados às cidades enquanto concentrações de recursos humanos e institucionais, onde coexistem problemas e oportunidades.
Esse reconhecimento justifica o compromisso de lançar uma política de cidades que deverá visar o sistema urbano como um todo e as cidades que o constituem.
A política de cidades que se pretende implementar durante a legislatura deverá integrar, de forma articulada, quatro pilares complementares:
a) Qualidade de vida e funcionalidade;
b) Competitividade e inovação;
c) Reabilitação e valorização dos espaços urbanos consolidados;
d) Qualificação e reinserção urbana de áreas críticas.
Embora uma política de cidades forte e coerente dependa da forma como se conseguir a integração destes quatro pilares, uma atenção muito particular deve ser dada à temática das áreas urbanas críticas. Com efeito, pela concentração de problemas sociais, pelo desfavorecimento e menor capacitação das suas populações, pela concentração de grupos mais vulneráveis às diferentes formas de discriminação, pelo estigma social que lhes anda associado e pelo bloqueio de oportunidades, estes espaços, por um lado, constituem o mais urgente desafio em termos de promoção da cidadania e da coesão social e, por outro, representam um grande risco no que respeita a comportamentos que podem minar a qualidade de vida e a competitividade das principais aglomerações metropolitanas. Acresce que, por essas mesmas razões, estes são os espaços urbanos onde é mais complexa a intervenção, menos duradouros se apresentam os seus resultados e mais necessário se torna encontrar formas inovadoras de intervenção que assegurem um forte envolvimento local e resultem em maior capacitação das populações.
Assim, e de modo a adquirir, desde já, experiência sobre soluções inovadoras que devem integrar, em função do resultado da sua avaliação, o pilar «Qualificação e reinserção urbana de áreas críticas» da política de cidades que se pretende implementar, são agora lançadas operações nesse domínio.
Existe já, em Portugal, alguma experiência de intervenção neste tipo de áreas urbanas, nomeadamente no âmbito do Programa de Reabilitação Urbana, das iniciativas comunitárias Urban (I e II) e da Intervenção Operacional de Renovação Urbana, que permitiram desenvolver acções onde tiveram relevo o desenvolvimento de parcerias numa perspectiva multidisciplinar, a participação das populações, a criação de estruturas locais de execução e o ajustamento das acções aos problemas específicos de cada uma das áreas.
O Programa Polis previa também uma componente dedicada a intervenções de requalificação em áreas de alojamento social, que não chegou a ser cabalmente potenciada.
Beneficiando da valia desta experiência, e tendo em vista o aprofundar da política de cidades que se pretende executar, importa prosseguir os esforços de desenvolvimento das políticas anteriores, aperfeiçoando e inovando nas metodologias e nos instrumentos de intervenção. É este sentido de procura e desenvolvimento de soluções inovadoras e duráveis que fundamenta a Iniciativa que agora se toma para o desenvolvimento de operações de requalificação urbana de bairros críticos.
Assim:
Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve aprovar o lançamento da Iniciativa Operações de Qualificação e Reinserção Urbana de Bairros Críticos, cujo âmbito e modelo de organização e funcionamento obedecerão ao determinado nos seguintes números:
1 - As operações a desenvolver pretendem estimular e testar soluções institucionais, procedimentais e tecnológicas inovadoras em termos da concepção, implementação e avaliação da acção pública em áreas urbanas críticas, e a experiência recolhida será levada em consideração na política de cidades que se pretende executar.
2 - Estas operações incidem sobre um número restrito de bairros das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, definidos pelo Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, ouvidas as respectivas câmaras municipais, e terão um horizonte temporal delimitado (2005-2007).
3 - Para cada bairro, deve ser preparado um programa de intervenção coerente e com um forte conteúdo inovador, nomeadamente nos seguintes domínios:
a) Concepção e natureza das intervenções, pondo em relevo a dimensão inovadora das soluções, a sustentabilidade das acções, a durabilidade dos resultados e a perenidade dos seus efeitos, sem dependência permanente de recursos públicos;
b) Metodologia, dando forte relevo à coordenação estratégica e à convergência de acção entre diversos actores e assumindo claramente a participação cívica como condição de êxito da intervenção;
c) Recursos, apostando na mobilização de novas fontes de financiamento e em parcerias público-privado.
4 - Os programas de intervenção em cada bairro devem responder a problemas imediatos e, ao mesmo tempo, estimular a criação de novas oportunidades a partir das potencialidades existentes, através de soluções desenvolvidas à luz dos seguintes princípios orientadores:
a) Natureza exemplar, inovadora e experimental das intervenções a concretizar;
b) Projectos mobilizadores viáveis, devendo cada intervenção incluir uma acção/projecto âncora com elevado potencial de mobilização dos moradores e de transformação estrutural das condições do bairro;
c) Foco na reabilitação e qualificação habitacional, urbanística e ambiental;
d) Coordenação estratégica e participação cívica como condições de êxito;
e) Exploração de novos recursos e mobilização de novas fontes de financiamento como factor de sustentabilidade;
f) Valor acrescentado e durabilidade de resultados e efeitos.
5 - Sem prejuízo da dimensão inovadora que se pretende estimular e no respeito dos princípios definidos no número anterior, são privilegiadas as acções que se enquadrem na seguinte tipologia:
a) Surgimento de novas formas organizativas, capazes de associar a prestação de serviços essenciais para a melhoria da qualidade de vida no bairro (incluindo a gestão e manutenção do espaço público e do edificado) à criação de novas oportunidades de emprego para os residentes;
b) Construção de respostas adequadas à integração social das crianças e dos jovens, bem como da população socialmente excluída e das minorias étnicas, nomeadamente através de acções nos domínios da educação, da formação, das artes, da cultura, do desporto e do lazer;
c) Surgimento de iniciativas e equipamentos de suporte necessários ao desenvolvimento de acções de animação, formação e acompanhamento no acesso ao emprego e à microempresa;
d) Disponibilização de espaços adequados ao desenvolvimento das actividades, incluindo as de natureza económica, dos residentes;
e) Dinamização e apoio a iniciativas de natureza arquitectónica, urbanística e ambiental que contenham uma dimensão inovadora significativa;
f) Preparação de um projecto global de reinserção funcional e urbanística do bairro na área (cidade) envolvente.
6 - Para cada bairro objecto desta Iniciativa será constituído um grupo de trabalho para, num processo fortemente participado e articulado com as organizações locais, preparar o programa de intervenção, traduzido num protocolo de parceria a celebrar entre todas as entidades envolvidas na sua execução.
7 - Cada grupo de trabalho integra representantes das seguintes entidades:
a) Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, que coordenará;
b) Ministro de Estado e da Administração Interna;
c) Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social;
d) Ministro da Saúde;
e) Ministro da Educação;
f) Ministro da Cultura;
g) Câmara municipal respectiva;
h) Junta de freguesia respectiva;
i) Outras entidades com experiência de trabalho relevante no bairro.
8 - Cada uma das entidades representadas no grupo de trabalho designa o seu representante no prazo de 15 dias a contar da data do despacho que selecciona o bairro.
9 - Os grupos de trabalho referidos no número anterior beneficiam de apoio metodológico a prestar pelo Instituto Nacional de Habitação para que as acções do programa de intervenção correspondam aos princípios anteriormente fixados.
10 - O contributo de cada grupo de trabalho deve estar concluído no prazo de seis meses e traduzir-se-á na identificação das acções e projectos concretos a desenvolver e na preparação de um protocolo de parceria que possa comprometer as entidades relevantes para o sucesso da operação.
11 - Os grupos de trabalho terminam as suas funções com a celebração do protocolo de parceria.
12 - O protocolo de parceria relativo a cada bairro estabelece:
a) Os objectivos concretos a atingir, a estratégia a prosseguir, o programa de acção a desenvolver, as metas a atingir e os mecanismos de monitorização e avaliação;
b) Os compromissos assumidos por cada um dos parceiros, incluindo a estrutura de financiamento da operação;
c) Os meios financeiros disponíveis para a execução das acções previstas;
d) Uma unidade de acção estratégica local com um modelo e composição ajustados às problemáticas, à natureza das parcerias, às capacidades de acção e às intervenções a implementar em cada bairro.
13 - O protocolo de parceria está sujeito a homologação conjunta do Ministro de Estado e das Finanças, do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e dos ministros competentes em razão das acções a desenvolver.
14 - A unidade de acção estratégica local é, ao nível de cada bairro, uma estrutura de animação e acompanhamento das acções e projectos a executar e tem como principal missão:
a) Dinamizar novas soluções e identificar e preparar as acções que concretizem o protocolo de parceria, bem como apoiar os seus executores no acesso aos financiamentos;
b) Elaborar as propostas que considere necessárias à optimização dos resultados da intervenção;
c) Assegurar a ocorrência das condições de durabilidade dos resultados alcançados e de continuidade das estruturas que venham a ser criadas.
15 - A coordenação desta Iniciativa cabe ao Instituto Nacional de Habitação, que para o efeito deve:
a) Apoiar a preparação dos protocolos de parceria, designadamente na definição das respectivas estruturas de financiamento;
b) Apoiar as unidades de acção estratégica local na execução dos protocolos de parceria;
c) Executar os procedimentos necessários para organizar os processos a submeter às entidades financiadoras, em particular ao mecanismo financeiro do espaço económico europeu;
d) Assegurar o relacionamento com as entidades financiadoras, sempre que o mesmo não seja da competência de outras entidades, designadamente o envio regular de relatórios relativos à implementação dos projectos financiados, bem como a comunicação de eventuais irregularidades detectadas;
e) Seleccionar, com o apoio dos coordenadores das unidades de acção estratégica local, as acções que dêem concretização aos protocolos de parceria e que devam ser financiadas por recursos orçamentais geridos pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional;
f) Desenvolver as acções necessárias para promover o envolvimento de financiamentos privados em projectos específicos no quadro desta Iniciativa;
g) Assegurar que os promotores dos projectos têm capacidade financeira e técnica necessária para que os projectos sejam implementados com sucesso;
h) Articular-se com os diversos serviços da Administração, para que seja desenvolvida, nos domínios das respectivas atribuições e dos programas por que sejam responsáveis, uma intervenção concertada com os objectivos dos programas de acção em cada bairro;
i) Assegurar o acompanhamento dos projectos e a avaliação da Iniciativa;
j) Promover a incorporação dos resultados alcançados nas políticas de qualificação e reinserção urbana a desenvolver no próximo período de programação dos fundos estruturais.
16 - É criada uma comissão de acompanhamento, que conta com o apoio do Instituto Nacional de Habitação, à qual compete emitir parecer quanto à selecção e desenvolvimento dos projectos e ao acompanhamento e avaliação da Iniciativa, e que é composta por representantes dos Ministros referidos no n.º 7 e das câmaras municipais envolvidas na Iniciativa.
17 - O financiamento desta Iniciativa é assegurado pela articulação, no quadro do protocolo de parceria, dos recursos dos orçamentos das entidades participantes e dos programas, com financiamento nacional ou comunitário, que contemplem a elegibilidade das acções em causa, sem prejuízo das suas regras específicas.
18 - Para além dos financiamentos referidos no número anterior, esta Iniciativa será objecto de uma candidatura a financiamento no âmbito do mecanismo financeiro do espaço económico europeu, até ao limite máximo de 12,5 milhões de euros.
19 - Os membros dos grupos de trabalho e da comissão de acompanhamento não auferem qualquer remuneração suplementar pelo exercício das funções previstas na presente resolução, acumulando as funções de origem com a participação na presente Iniciativa.
20 - A presente Iniciativa vigora até 31 de Dezembro de 2007.
Presidência do Conselho de Ministros, 2 de Agosto de 2005. - O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.