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Acórdão 6/2005, de 14 de Julho

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Sumário

Fixa a seguinte jurisprudência: à luz do preceituado no artigo 23.º do Código de Processo Penal vigente, se num processo for ofendido, pessoa com faculdade de se constituir assistente ou parte civil, um magistrado, e para esse processo devesse ter competência territorial o tribunal onde o magistrado exerce funções, é competente o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede na circunscrição mais próxima, ainda que na circunscrição judicial onde aquele magistrado exerce funções existam outros juízes ou juízos da mesma hierarquia e espécie.

Texto do documento

Acórdão 6/2005
Acordam, em tribunal pleno, os juízes das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça:

1 - O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, junto do Tribunal da Relação de Lisboa, veio, nos termos dos artigos 437.º e seguintes do Código de Processo Penal, interpor o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do Acórdão proferido em 25 de Novembro de 1998 no processo 4737/98, da Relação de Lisboa, transitado em julgado, com os seguintes fundamentos:

No acórdão recorrido decidiu-se que, se num processo for ofendido um magistrado e para o mesmo devesse ter competência um tribunal situado na circunscrição territorial onde esse magistrado exerce funções, é competente, ainda que nessa circunscrição haja outros tribunais de igual ou diferente espécie, o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede na circunscrição territorial mais próxima, salvo tratando-se do Supremo Tribunal de Justiça.

Enquanto, no acórdão fundamento, Acórdão desse mesmo Tribunal da Relação proferido em 30 de Abril de 1997 no processo 1976/97, foi decidido que, em comarcas com mais de um juízo, se aplica o preceituado no artigo 23.º do Código de Processo Penal, no sentido de a competência dever atribuir-se a um outro dos aí existentes (o juiz substituto), sem necessidade de fazer intervir juízes de outra comarca.

Assentariam, deste modo, as duas decisões em confronto em soluções opostas sobre a mesma questão de direito, que seria a da interpretação a dar ao termo "tribunal» constante do artigo 23.º do Código de Processo Penal quando na comarca existir mais de um juízo.

Ambas as decisões aludidas foram proferidas no domínio da mesma legislação - o Código de Processo Penal de 1987 -, tendo transitado em julgado, não sendo admissível recurso ordinário do acórdão recorrido.

2 - A legitimidade do magistrado recorrente é indiscutível - artigo 437.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

Admitido o recurso em causa, os autos subiram ao Supremo Tribunal de Justiça, e, proferido o despacho liminar e colhidos os vistos, os autos foram presentes à conferência, havendo-se decidido por acórdão de fl. 28 a fl. 29 que se achavam verificados todos os pressupostos do recurso para fixação de jurisprudência de harmonia com o estatuído nos artigos 437.º e 438.º do Código de Processo Penal, como ainda reconhecida a tempestividade do recurso, a existência de invocada oposição e que tanto o acórdão recorrido como o acórdão fundamento já haviam transitado em julgado.

3 - Cumprido o disposto no artigo 442.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, somente alegou o Ministério Público.

Nas suas doutas alegações o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, junto deste Supremo Tribunal, propõe que seja fixada jurisprudência, nos termos seguintes:

"Se num processo for o ofendido, pessoa com faculdade de se constituir assistente ou parte civil, um magistrado, e para o processo devesse ter competência, por força das regras sobre competência territorial, o tribunal onde o magistrado exerce funções, é competente o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede na circunscrição territorial mais próxima, ainda que nessa circunscrição haja outros tribunais de igual ou diferente espécie.»

4 - A decisão preliminar constante do acórdão proferido de fl. 28 a fl. 29 não vincula o tribunal pleno.

Contudo, afigura-se-nos evidente a oposição entre os julgados, verificando-se os demais requisitos aludidos nos artigos 437.º e 438.º do Código de Processo Penal.

5 - Foram colhidos os vistos legais e, agora, cumpre decidir.
6 - Tudo visto e considerado:
A questão fundamental a apreciar e a decidir consiste em saber, relativamente a um processo em que for ofendido, pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil, um magistrado, e para o processo devesse ter competência (por força das regras sobre competência territorial) o tribunal onde o magistrado exerce funções, qual será o tribunal competente da mesma hierarquia ou espécie com sede mais próxima, salvo tratando-se do Supremo Tribunal de Justiça, de harmonia com o disposto no artigo 23.º do Código de Processo Penal.

Com efeito, o citado artigo 23.º estatui o seguinte:
"Se num processo for ofendido, pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil, um magistrado, e para o processo devesse ter competência, por força das disposições anteriores, o tribunal onde o magistrado exerce funções, é competente o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede mais próxima, salvo tratando-se do Supremo Tribunal de Justiça.»

O mesmo artigo 23.º está inserido na secção II, "Competência territorial», do capítulo II do livro I da parte I do aludido Código.

A jurisprudência dos nossos tribunais tem perfilhado fundamentalmente dois tipos de soluções, perante o disposto no citado artigo 23.º

Uma dessas soluções considera que, se num processo for ofendido um magistrado, e para o processo devesse ter competência um tribunal situado na circunscrição territorial onde esse magistrado exerce funções, é competente, ainda que nessa circunscrição haja outros tribunais de igual ou diferente espécie, o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede na circunscrição territorial mais próxima, salvo tratando-se do Supremo Tribunal de Justiça.

Uma outra solução tem assentado no entendimento segundo o qual, nas circunscrições judiciais com mais de um juízo, o disposto no aludido artigo 23.º haverá de interpretar-se no sentido de a competência dever atribuir-se a um dos outros aí existentes (o juiz substituto), sem necessidade de fazer intervir juízes de outra circunscrição judicial.

Vejamos, agora, o exemplo histórico que constava do Código de Processo Penal de 1929, e o actual regime, com as disposições paralelas, em vigor no actual Código de Processo Civil.

7 - O artigo 52.º do Código de Processo Penal de 1929 estabelecia o seguinte:
"Para os processos em que for ofendido o juiz de direito ou o agente do Ministério Público perante ele, por infracções contra eles cometidas nas respectivas comarcas, por factos alheios às suas funções, ou em que forem partes ou ofendidos suas mulheres, descentente ou irmão deles, é competente o juízo de direito da comarca mais próxima.

§ 1.º Nas comarcas em que houver mais de um juiz de direito será competente o que não estiver inibido, se houver apenas dois, e, se forem mais de dois, aquele dos não inibidos que a sorte designar.

§ 2.º ...»
Como se vê, a questão que agora nos ocupa, no Código de Processo Penal de 1929, que antecedeu o Código vigente, achava-se regulada com a maior clareza.

O conselheiro Luís Osório, em comentário ao mencionado artigo 52.º, escreveu:
"A alteração da competência territorial, contida neste artigo, deve ter por fim evitar a falta da necessária liberdade das pessoas que no processo têm de funcionar, visto que, de outra forma, se encontrariam mais ou menos coagidas pelo facto de o juiz ou o agente do Ministério Público da comarca ter interesse no processo.» (In Comentário ao Código do Processo Penal Português, 1.º vol., Coimbra, 1932, p. 465.)

No que concerne ao regime actualmente vigente em processo civil, relativamente às "acções em que seja parte o juiz, seu cônjuge ou certos parentes», o artigo 89.º do Código de Processo Civil estatui:

"1 - Para as acções em que seja parte o juiz de direito, seu cônjuge, algum seu descendente ou ascendente ou quem com ele conviva em economia comum e que devessem ser propostas na circunscrição em que o juiz exerce jurisdição é competente o tribunal da circunscrição judicial cuja sede esteja a menor distância da sede daquela.

2 - ...
3 - ...
4 - O disposto nos números anteriores não tem aplicação nas circunscrições em que houver mais de um juiz.»

Também no que respeita ao tipo de acções acabadas de mencionar, em processo civil não se têm levantado dúvidas ou dificuldades relevantes no que toca à interpretação dessas regras de alteração de competência em razão do território.

Quanto à questão que está na origem dos presentes autos, analisemos algumas tomadas de posição da doutrina jurídica portuguesa.

8 - Os conselheiros Simas Santos, Leal Henriques e Borges de Pinho, em anotação ao artigo 23.º do Código de Processo Penal, sustentam:

"Sempre que um magistrado (judicial ou do Ministério Público) esteja envolvido em processo [...], e para sua tramitação fosse competente, de acordo com as regras das anteriores disposições, o tribunal onde o magistrado exerce efectivamente funções, essa competência passa para o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede mais próxima daquele.»

E os mesmos ilustres autores, seguidamente, esclarecem:
"O tribunal com sede mais próxima será aquele que como tal for considerado pelos instrumentos legais sobre organização judiciária (lei orgânica e respectivo regulamento).» (V. Código de Processo Penal Anotado, 1.º vol., Lisboa, 1996, pp. 175 e 176.)

Por seu turno, o Dr. José da Costa Pimenta, em anotação ao citado artigo 23.º, e relativamente à expressão legal "o tribunal [...] com sede mais próxima», escreve:

"A proximidade tem como ponto de referência a sede do tribunal e há-de ser aferida em termos de quilometragem rodoviária, ferroviária ou, sendo caso disso, marítima, fluvial ou aérea (haja em vista os arquipélagos dos Açores e da Madeira).» (V. Código de Processo Penal Anotado, 2.ª ed., Lisboa, 1991, p. 105.)

9 - Teria sido fácil ao legislador haver incluído, no artigo 23.º do Código de Processo Penal, uma disposição análoga à do n.º 4 do artigo 89.º do Código de Processo Civil, a aplicar "nas circunscrições em que houver mais de um juiz».

Contudo, não foi esse o caminho escolhido, daí que, relativamente a processo respeitante a magistrado, em processo penal, em que por força das disposições dos artigos 19.º a 22.º do Código de Processo Penal devesse ser competente territorialmente o tribunal onde o magistrado exerce funções (independentemente de na circunscrição haver mais de um juiz ou outros juízos da mesma hierarquia ou espécie), seja competente o tribunal com sede mais próxima.

Em suma: na hipótese prevista no artigo 23.º do Código de Processo Penal, em processo respeitante a magistrado, a competência para os seus termos e para dele conhecer pertence à circunscrição judicial com sede mais próxima, ainda que na circunscrição onde o respectivo magistrado exerce funções existam outros juízes ou juízos da mesma hierarquia e espécie.

Logo, entendemos que no acórdão recorrido se decidiu acertadamente e de harmonia com a lei, não merecendo acolhimento a solução perfilhada no acórdão fundamento.

10 - Nestes termos e concluindo:
Acordam os juízes das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça em confirmar o acórdão recorrido, fixando-se jurisprudência nos seguintes termos:

"À luz do preceituado no artigo 23.º do Código de Processo Penal vigente, se num processo for ofendido, pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil, um magistrado, e para esse processo devesse ter competência territorial o tribunal onde o magistrado exerce funções, é competente o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede na circunscrição mais próxima, ainda que na circunscrição judicial onde aquele magistrado exerce funções existam outros juízes ou juízos da mesma hierarquia e espécie.»

Sem tributação.
Oportunamente, cumpra-se o disposto no artigo 444.º do Código de Processo Penal.

Lisboa, 12 de Maio de 2005. - Florindo Pires Salpico - José António Carmona da Mota - António Pereira Madeira - Manuel José Carrilho de Simas Santos - José Vaz dos Santos Carvalho - António Joaquim da Costa Mortágua - António Silva Henriques Gaspar - António Luís Gil Antunes Grancho - Políbio da Rosa Silva Flor - António Artur Rodrigues da Costa - José Vítor Soreto de Barros - Armindo dos Santos Monteiro - João Manuel de Sousa Fonte - Fernando José da Cruz Quinta Gomes - Arménio Augusto Malheiro de Castro Sottomayor - Alfredo Rui Francisco do Carmo Gonçalves Pereira - Luís Flores Ribeiro.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/187838.dre.pdf .

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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