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Parecer (extrato) 19/2025, de 6 de Agosto

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Sumário

Discriminação de pessoas com deficiência em contexto educativo. Competência administrativa contraordenacional.

Texto do documento

Parecer (extrato) n.º 19/2025

Conclusões:

1.ª Uma autoridade administrativa só é competente para instruir procedimentos contraordenacionais, aplicar as pertinentes sanções e, se for caso disso, proceder à sua anulação administrativa, se a própria lei a identificar como tal ou se, apesar da falta de menção, já dispuser de poderes de inspeção ou de fiscalização sobre a matéria ou o objeto da infração.

2.ª Se a competência material se reconhece a partir do objeto, não dispensa, antes pressupõe, conhecer as atribuições da pessoa coletiva pública, do ministério ou secretaria regional de que o órgão faz parte.

3.ª Justamente por esse motivo, o artigo 34.º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações (RGCO) confia a especificação da autoridade administrativa, em caso de dúvida, ao poder de direção ou de superintendência de cada membro do Governo, no âmbito das atribuições do Estado que são confiadas ao ministério que dirige e que a lei designa por “tutela dos interesses que a contraordenação visa defender ou promover”.

4.ª As atribuições são delimitadas por enunciados normativos que indicam um setor ou instituição da vida económica, social ou cultural, um conjunto de necessidades coletivas ou de bens e serviços aptos à sua satisfação, mas, não raro, o legislador inscreve conjuntamente o fim ou o interesse público que ordena teleologicamente o exercício dos poderes e o desempenho das tarefas que integram a competência dos órgãos.

5.ª A competência material de cada órgão e as atribuições da respetiva pessoa coletiva pública ou ministério complementam-se, não apenas na delimitação da função do órgão e serviços que dele dependemum certo domínio (v.g. saúde) ou uma determinada política pública (v.g. transição energética)-, como também na identificação do fim, o qual deve sempre constituir o motivo principalmente determinante dos seus atos.

6.ª A Lei 46/2006, de 28 de agosto, ao ter estatuído que as práticas discriminatórias de pessoas com deficiência ou sob risco agravado de saúde, sem prejuízo da ilicitude que representam para efeitos de responsabilidade civil, constituem ilícito de mera ordenação social, é conforme com a diretriz programática inscrita no artigo 71.º, n.º 2, da Constituição, como é conforme, igualmente, à incumbência de o Estado garantir o respeito universal pelos direitos e liberdades fundamentais [artigo 9.º, alínea b)], de efetivar os direitos económicos, sociais e culturais, mediante a transformação das estruturas económicas e sociais e de promover uma igualdade não meramente formal [artigo 9.º, alínea d)].

7.ª De harmonia com o objetivo de uma política integrada e transversal, consignado pelo artigo 3.º das Bases Gerais da Prevenção, Habilitação, Reabilitação e Participação da Pessoa com Deficiência (Lei 38/2004, de 18 de agosto), optou o legislador, no Decreto Lei 34/2007, de 15 de fevereiro, por fazer da prevenção e perseguição de tais práticas discriminatórias uma incumbência transversal, conservando o Instituto Nacional para a Reabilitação, I. P., nas suas atribuições, um papel de recolha e tratamento de informação, estudo, conceção, análise e promoção da inclusão das pessoas com deficiência.

8.ª É, assim, uma política pública que, além de comprometer as administrações autónomas, percorre múltiplas atribuições do Estado, repartidas por vários departamentos da administração direta ou indireta, em relação hierárquica ou de superintendência com um determinado membro do Governo, tanto quanto na sua atividade se deparem com práticas discriminatórias da pessoa com deficiência e tenham ao seu alcance meios para as prevenir e reprimir.

9.ª Entre esses meios relevam a proximidade aos diversos circunstancialismos institucionais ou setoriais em que a discriminação é praticada, os saberes técnicocientíficos aplicados, o conhecimento do contexto e a experiência adquirida:

numa palavra, razões que justificam o princípio da especialidade das pessoas coletivas públicas, dos ministérios e secretarias regionais e das atribuições confiadas a cada um, assim como a repartição da competência entre os diversos órgãos.

10.ª No artigo 4.º da Lei 46/2006, de 28 de agosto, encontram-se descritas práticas discriminatórias que podem ocorrer em qualquer serviço ou estabelecimento público, particular ou cooperativo [alíneas a), b), d), e), j) e m)] ou mesmo no espaço público ou comunicacional [alínea l)], ao passo que outras encontram-se adstritas a elementos típicos que as circunscrevem ao mercado imobiliário, à banca e seguros [alínea c)], aos transportes públicos [alínea f)], aos cuidados de saúde [alínea g)] ou à educação, incluindo o ensino particular e cooperativo [alíneas h) e i)].

11.ª Uma vez que os artigos 3.º, n.º 1, e 4.º, n.º 1, do Decreto Lei 34/2007, de 15 de fevereiro, acolheram um critério material e objetivo, conferindo competência contraordenacional às inspeções-gerais, entidades reguladoras,

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ou outra entidade com competências de natureza inspetiva ou sancionatória, cujas atribuições incidam sobre a matéria objeto da infração

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, excluiu como critério de apuramento da competência a natureza jurídica ou estatuto do agente contraordenacional. Por outras palavras, excluiu todo e qualquer critério subjetivo na identificação da autoridade administrativa competente.

12.ª É este, aliás, o critério preferencial e subsidiário do RGCO, pois, como se viu, o artigo 34.º, n.º 2, determina que,

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no silêncio da lei serão competentes os serviços designados pelo membro do Governo responsável pela tutela dos interesses que a contraordenação visa defender ou promover

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.

13.ª Como tal, é indiferente que os promotores das atividades de animação e apoio à família, da componente de apoio à família ou das atividades de enriquecimento curricular sejam qualificados como prestadores de serviços, sem mais, tratando-se de associações de pais e encarregados de educação, de instituições particulares de solidariedade social ou de outros agentes para reconhecer competência à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) com base no artigo 2.º, n.º 2, alínea a), subalínea i), do Decreto Lei 194/2012, de 23 de agosto, quanto mais não seja, pelo caráter residual dessa disposição, dando preferência às

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competências atribuídas por lei a outras entidades

»

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14.ª As referidas atividades, designadas “Escola a Tempo Inteiro”, sem embargo de uma componente lúdica e recreativa que podem e devem ter e não obstante o seu principal escopo consistir no apoio às famílias, prolongando a permanência das crianças na escola, creche ou infantário, fora dos horários letivos e durante as férias escolares, fazem parte do sistema educativo, sejam elas promovidas pelo agrupamento de escolas ou por terceiros.

15.ª A descentralização de atribuições educativas para os municípios, compreendendo o fomento de medidas de apoio à família que garantam uma escola a tempo inteiro (artigo 39.º, n.º 1, do Decreto Lei 21/2019, de 30 de janeiro) além de se encontrar parcialmente suspensa, nos termos do artigo 74.º, não subtraiu tais atividades ao sistema educativo.

16.ª As atividades de animação e apoio à família, a componente de apoio à família e as atividades de enriquecimento curricular, ainda quando promovidas pelas autarquias locais, devem conformar-se com as diretrizes aprovadas pelos órgãos da escola, do estabelecimento de educação préescolar ou do agrupamento de escolas, designadamente através do plano educativo e do regulamento interno e encontram-se sob supervisão do conselho pedagógico [artigo 33.º, alínea g), do Decreto Lei 75/2008, de 22 de abril] e do diretor [artigo 20.º, n.º 2, alínea h)].

17.ª Sem prejuízo da ampla autonomia que assiste aos agrupamentos escolares e às escolas que permanecem não agrupadas, os seus órgãos continuam a ser órgãos do Estado que, embora desconcentrados e periféricos se encontram hierarquicamente subordinados ao Ministro da Educação, Ciência e Inovação.

18.ª Se os promotores das atividades de animação e apoio à família, da componente de apoio à família ou das atividades de enriquecimento curricular não forem os próprios agrupamentos, mas, sim, os municípios ou as freguesias, tais atividades não se tornam independentes, antes se constituindo uma relação interadministrativa de cooperação entre o Estado e as autarquias locais.

19.ª A ser promotora uma associação de pais e encarregados de educação, uma instituição particular de solidariedade social ou um prestador comercial ou cooperativo de serviços de atividades em tempos livres, ocorre uma delegação de funções públicas em agentes privados cujo desempenho é conformado pelos órgãos escolares e pela DireçãoGeral dos Estabelecimentos Escolares, nos termos da Portaria 644-A/2015, de 24 de agosto, e no que concerne ao recrutamento de técnicos profissionais, pelo Decreto Lei 212/2009, de 3 de setembro.

20.ª Por outro lado, não teve lugar nem se encontra prevista qualquer transferência de competências inspetivas do Ministério da Educação, Ciência e Inovação ou das secretarias regionais de educação das regiões autónomas para as autarquias locais.

21.ª Competindo exclusivamente à InspeçãoGeral da Educação e Ciência (IGEC), no território continental, fiscalizar o sistema educativo

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no âmbito da educação préescolar, da educação escolar, compreendendo os ensinos básico, secundário e superior e integrando as modalidades especiais de educação

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(artigo 11.º, n.º 1, do regime orgânico do Ministério da Educação e Ciência) e fiscalizar também as escolas particulares e cooperativas (artigo 7.º, n.º 2, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) é este o órgão especialmente vocacionado para perseguir as práticas discriminatórias que possam verificar-se contra as pessoas com deficiência ou em risco agravado de saúde no acesso ou frequência das atividades denominadas “Escola a Tempo Inteiro”.

22.ª E nada obsta a que a IGEC aplique coimas por tais práticas discriminatórias a municípios ou freguesias, visto o artigo 9.º, n.º 2, da Lei 46/2006, de 28 de agosto, ao estabelecer o ilícito de mera ordenação social, referir-se, expressamente, a pessoas coletivas, quer de direito privado quer de direito público.

23.ª Nem tãopouco se encontra a IGEC a praticar atos de tutela administrativa ou a invadir as atribuições do Estado confiadas, nesse domínio, à InspeçãoGeral de Finanças.

24.ª Embora a tutela sobre a administração autónoma integre a competência administrativa do Governo [artigo 199.º, alínea d)) da Constituição], a Lei 27/96, de 1 de agosto, confiou aos tribunais administrativos decretarem a perda de mandato dos eleitos locais e dissolverem órgãos colegiais do município ou da freguesia que tiverem praticado ilícitos tutelares (artigo 11.º, n.º 1) em ação a propor pelo Ministério Público, por qualquer membro do órgão de que faz parte aquele contra quem for formulado o pedido, ou por quem tenha interesse direto em demandar, o qual se exprime pela utilidade derivada da procedência da ação (n.º 2).

25.ª Pelo contrário, a aplicação de coimas e de sanções acessórias aos municípios e às freguesias permaneceu na função administrativa do Estado, sem prejuízo de a última palavra caber sempre aos tribunais por via da impugnação ou do recurso que possam vir a ter lugar

26.ª E, a partir de outro ângulo, observamos que a tutela administrativa, a começar pelas modalidades integrativas, de autorização ou aprovação de certos atos, contratos e regulamentos (tutela integrativa a priori ou a posteriori), embora não possa fundamentar-se em considerações de mérito ou oportunidade, mas só de estrita legalidade (artigo 242.º, n.º 1, da Constituição) compreende sempre uma intervenção mais ou menos restritiva na autonomia do município ou da freguesia (n.º 2), o que não sucede com a aplicação de coimas.

27.ª As autarquias locais arguidas em procedimento contraordenacional conhecem os mesmos direitos e garantias que as pessoas coletivas privadas ou de direito privado, sem lhes ser legítimo opor a autonomia local à aplicação de coimas por uma autoridade administrativa do Estado, das regiões autónomas ou por uma entidade reguladora independente.

28.ª A IGEC não deve ver diminuída a sua competência nos casos de concurso de contraordenações compreendidos na previsão do artigo 36.º, n.º 1, do RGCO, nem no caso de comparticipação, tal como é previsto no n.º 2.

29.ª A norma que confere competência a qualquer uma das autoridades a quem incumba processar qualquer uma das contraordenações em concurso tem de ser interpretada restritivamente, de modo a não inquinar a decisão com nulidade por incompetência absoluta [artigo 161.º, n.º 2, alínea b)] do Código do Procedimento Administrativo), sem que possa sequer vir a ser ratificada pelo órgão competente (artigo 166.º, n.º 1 e n.º 2, a contrario sensu).

30.ª Assim, o reconhecimento da competência por conexão deve circunscrever-se ao interior da mesma pessoa coletiva, ministério ou secretaria regional, de modo a que um seu órgão se limite às atribuições da estrutura orgânica da qual faz parte, sendo que a anulabilidade decorrente da incompetência relativa pode ser sanada por ratificação do órgão competente ou pelo decurso dos prazos para a sua impugnação ou anulação oficiosa.

31.ª De outro modo, as normas do artigo 36.º do RGCO incorreriam em inconstitucionalidade material ao desobrigarem um órgão para com o concreto interesse público que deve prosseguir (artigo 266.º, n.º 1, da Constituição), na exata medida do exercício das suas funções (n.º 2), subvertendo o princípio da competência e, por conseguinte, o princípio da legalidade (artigo 3.º, n.º 2). https:

//www.ministeriopublico.pt/sites/default/files/2025-07/pa_2025_19.pdf

Este Parecer foi votado na sessão do Conselho Consultivo da ProcuradoriaGeral da República de 26 de junho de 2025.

Amadeu Francisco Ribeiro GuerraEduardo André Folque da Costa Ferreira (Relator)-João Conde Correia dos SantosJosé Joaquim Arrepia FerreiraCarlos Alberto Correia OliveiraRicardo Lopes Dinis PedroJosé Manuel Gonçalves Dias Ribeiro de AlmeidaHelena Maria de Carvalho Gomes de MeloAntónio Carlos Tomás RibeiroHelena Maria Carvalho Martins Leitão.

Este Parecer foi homologado por despacho de 20 de julho de 2025 de Sua Excelência o Ministro da Educação, Ciência e Inovação.

31 de julho de 2025.-O SecretárioAdjunto da ProcuradoriaGeral da República, Rui Dias Fernandes.

319385961

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/6266759.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1996-08-01 - Lei 27/96 - Assembleia da República

    ESTABELECE O REGIME JURÍDICO DA TUTELA ADMINISTRATIVA A QUE FICAM SUJEITAS AS AUTARQUIAS LOCAIS E ENTIDADES EQUIPARADAS, BEM COMO O RESPECTIVO REGIME SANCIONATÓRIO. SAO CONSIDERADAS ENTIDADES EQUIPARADAS A AUTARQUIAS LOCAIS AS ÁREAS METROPOLITANAS, AS ASSEMBLEIAS DISTRITAIS E AS ASSOCIAÇÕES DE MUNICÍPIOS DE DIREITO PÚBLICO E A TUTELA ADMINISTRATIVA CONSISTE NA VERIFICAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS LEIS E REGULAMENTOS POR PARTE DOS ÓRGÃOS E DOS SERVIÇOS DAS AUTARQUIAS LOCAIS E ENTIDADES EQUIPARADAS, QUE PODE ASSUMI (...)

  • Tem documento Em vigor 2004-08-18 - Lei 38/2004 - Assembleia da República

    Define as bases gerais do regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação da pessoa com deficiência.

  • Tem documento Em vigor 2006-08-28 - Lei 46/2006 - Assembleia da República

    Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde.

  • Tem documento Em vigor 2007-02-15 - Decreto-Lei 34/2007 - Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social

    Regulamenta a Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, que tem por objecto prevenir e proibir as discriminações em razão da deficiência e de risco agravado de saúde.

  • Tem documento Em vigor 2008-04-22 - Decreto-Lei 75/2008 - Ministério da Educação

    Aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.

  • Tem documento Em vigor 2009-09-03 - Decreto-Lei 212/2009 - Ministério da Educação

    Estabelece o regime de contratação de técnicos que asseguram o desenvolvimento das actividades de enriquecimento curricular (AEC) no 1.º ciclo do ensino básico nos agrupamentos de escolas da rede pública.

  • Tem documento Em vigor 2012-08-23 - Decreto-Lei 194/2012 - Ministério da Economia e do Emprego

    Aprova a orgânica da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica.

  • Tem documento Em vigor 2019-01-30 - Decreto-Lei 21/2019 - Presidência do Conselho de Ministros

    Concretiza o quadro de transferência de competências para os órgãos municipais e para as entidades intermunicipais no domínio da educação

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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