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Acórdão 329/92, de 14 de Novembro

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Sumário

Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 162.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), na redacção introduzida pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 463/85, de 4 de Novembro, mas apenas no segmento em que estabelece, para as coimas nele previstas aplicadas a pessoas singulares, um limite máximo superior ao fixado no regime geral do ilícito de mera ordenação social (artigo 17.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 17 de Outubro), por violação do artigo 168.º, n.º 1, alínea d), parte final, da Constituição.

Texto do documento

Acórdão 329/92
Processo 161/92
Acordam, em conferência, no plenário do Tribunal Constitucional:
I
1 - O procurador-geral-adjunto em exercício no Tribunal Constitucional, na sua qualidade de representante do Ministério Público, veio requerer, ao abrigo dos artigos 281.º, n.º 3, da Constituição e 82.º da Lei do Tribunal Constitucional, que este Tribunal apreciasse e declarasse, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 162.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), aprovado pelo Decreto-Lei 38382, de 7 de Agosto de 1951, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 463/85, de 4 de Novembro, na parte em que estabelece para as coimas nele previstas um limite máximo superior ao fixado no regime geral do ilícito de mera ordenação social.

De harmonia com o mesmo requerimento, a norma indicada, no segmento assinalado, foi julgada inconstitucional através dos Acórdãos n.os 324/90, de 13 de Dezembro, da 1.ª Secção [publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 65 (suplemento), de 19 de Março de 1991], e 126/92 e 154/92, de 1 e 22 de Abril, ambos da 2.ª Secção e ainda inéditos.

O requerente juntou cópia desses acórdãos.
2 - Notificado o Primeiro-Ministro, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, não ofereceu qualquer resposta no prazo legal.

O processo foi distribuído, após o decurso do prazo para tal resposta.
II
3 - O Decreto-Lei 38382, de 7 de Agosto de 1951, aprovou o RGEU, diploma de 168 artigos que disciplina a execução de novas edificações ou de quaisquer obras de construção civil, a reconstrução, ampliação, alteração, reparação ou demolição das edificações e obras existentes dentro do perímetro urbano e das zonas rurais de protecção fixadas para as sedes de concelho e para as demais localidades sujeitas por lei a plano de urbanização e expansão. Este diploma permanece ainda hoje em vigor, embora com alterações introduzidas por legislação avulsa ao longo dos mais de 40 anos da sua vigência.

Na primitiva redacção, dispunha o artigo 162.º do RGEU:
A supressão das árvores ou maciços abrangidos pela disposição do artigo 126.º, quando os proprietários tenham sido previamente notificados da interdição do respectivo corte, será punida com multa de 200$00 a 2000$00.

Por seu turno, o artigo 161.º deste Regulamento, também na sua versão primitiva, estatuía:

A execução de quaisquer obras em contravenção das disposições deste Regulamento, sem licença ou em desacordo com o projecto ou condições aprovadas, será punida com multa de 100$00 a 1000$00.

O Decreto-Lei 463/85, de 4 de Novembro, veio dar nova redacção ao § único do artigo 5.º e aos artigos 161.º, 162.º, 163.º e 164.º do RGEU. No preâmbulo daquele decreto-lei indicava-se que este último Regulamento estava então a ser objecto de aprofundada revisão, justificando-se que, de uma forma intercalar, fossem introduzidas no RGEU e no Decreto-Lei 166/70, de 15 de Abril, nas matérias com aquele conexas, «as alterações indispensáveis à sua adequação aos diplomas sobre competências dos órgãos municipais e ao regime sancionador dos ilícitos administrativos, mantendo, nesta matéria, a sanção penal para os casos de desobediência às ordens de suspensão (artigo 20.º do Decreto-Lei 166/70, de 15 de Abril), o que oportunamente será actualizado quanto à medida da pena».

A nova redacção do artigo 162.º do RGEU, introduzida em 1985, tem o seguinte teor:

A execução de quaisquer obras em violação das disposições deste Regulamento, sem licença ou em desacordo com os seus termos ou com o projecto aprovado será punida com coima de 5000$00 a 5000000$00.

No artigo anterior, na nova redacção do Decreto-Lei 463/85, dispõe-se que constitui contra-ordenação «a violação do disposto no presente Regulamento e nos regulamentos municipais neste previstos, competindo aos serviços de fiscalização da câmara municipal competente a instrução do respectivo processo, sem prejuízo das competências de fiscalização das autoridades policiais, cumulativamente».

4 - A partir de 1982, estabelece o artigo 168.º da Constituição, na parte final da alínea d) do seu n.º 1, que é da exclusiva competência da Assembleia, salvo autorização ao Governo, legislar sobre o «regime geral [...] dos actos ilícitos de mera ordenação social e do respectivo processo».

No Acórdão 324/90 considerou-se que o Governo podia alterar através de decreto-lei não autorizado pela Assembleia da República a qualificação de ilícito administrativo, convertendo-o em ilícito de mera ordenação social, desse modo operando uma «desgraduação» ou «conversão» de ilícito. Invocou-se neste ponto a doutrina acolhida no Acórdão 56/84 do Tribunal Constitucional (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 3.º vol., 1984, p. 174).

No que toca à fixação das coimas e outras sanções aplicáveis às contra-ordenações, considerou-se que o Governo podia, independentemente de autorização legislativa conferida pela Assembleia da República, fixar as coimas e outras sanções aplicáveis a certos comportamentos qualificados como contra-ordenações, desde que fosse respeitado o diploma que estabelece o regime geral de punição das contra-ordenações (Decreto-Lei 433/82, de 17 de Outubro). E escreveu-se depois:

Ora, no que toca às pessoas singulares e às contra-ordenações por elas praticadas dolosamente, o artigo 17.º [n.º 1] do Decreto-Lei 433/82 estabelece que «o montante mínimo da coima será de 200$00 e o máximo de 200000$00» (não importa agora considerar, claro, os novos valores constantes da redacção introduzida pelo Decreto-Lei 356/89, de 17 de Outubro, visto que os mesmos só entraram em vigor em Janeiro de 1990). Tal significa que o Governo não podia estabelecer limite mínimo inferior ao estabelecido no Decreto-Lei 433/82, nem limite máximo superior ao limite fixado neste último diploma, sob pena de inconstitucionalidade orgânica na diferença para menos ou para mais, respectivamente. Aconteceu, porém, que no Decreto-Lei 463/85 o valor máximo ultrapassa o limite de 200000$00, estando fixado em 5000000$00! É clara a inconstitucionalidade orgânica parcial da nova redacção do corpo do artigo 162.º do RGEU, precisamente na parte em que fixa um limite máximo para a coima superior ao limite do regime geral de 200000$00. [In Diário da República, 2.ª série, n.º 65, de 19 de Março de 1991, p. 3268-(17).]

Nos Acórdãos n.os 126/92 e 154/92, julgou-se parcialmente inconstitucional a norma do artigo 162.º do RGEU, na redacção introduzida em 1985, pelos mesmos motivos.

Pode ler-se no primeiro destes acórdãos:
Ora, de acordo com essa jurisprudência [faz-se referência aos Acórdãos n.os 221/89, 414/89, 324/90, 435/91 e 447/91], o artigo 162.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, na parte em que fixa para as coimas devidas por violação dos artigos 1.º e 2.º um máximo superior a 200000$00 (redacção originária do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei 433/82) ou a 500000$00 (redacção actual do mesmo preceito), é inconstitucional, por violação do citado artigo 168.º, n.º 1, alínea d), da Constituição.

E no segundo destes acórdãos escreveu-se:
[...] isso significa que, desacompanhado da necessária autorização parlamentar, o Governo, ao tempo, não poderia definir contra-ordenações ou «desgraduar» contravenções em contra-ordenações para cujas punições se estabelecessem coimas mínimas inferiores a 200$00 ou máximas superiores a 200000$00. Estava, ao tempo, consequentemente, o Governo balizado por aqueles limites, tendo liberdade para, entre eles, estabelecer as coimas que se mostrassem adequadas e proporcionadas ao sancionamento do ilícito contra-ordenacional definido de novo ou estatuído por «desgraduação» de prévio ilícito administrativo.

5 - Nada há a acrescentar ao que se escreveu nos citados acórdãos, os quais acolhem uma orientação jurisprudencial firme que se desenrola desde o referido Acórdão 56/84.

Considera-se, assim, organicamente inconstitucional, por violação do artigo 168.º, n.º 1, alínea d), segunda parte, da Constituição, o segmento da norma do artigo 162.º do RGEU, na redacção em vigor a partir de 1985, que estabelece como limite máximo da coima a aplicar a pessoas singulares a quantia de 5000000$00, superior ao limite máximo previsto no regime geral do ilícito de mera ordenação social.

III
6 - Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide o Tribunal Constitucional declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 162.º do RGEU, na redacção introduzida pelo artigo 1.º do Decreto-Lei 463/85, de 4 de Novembro, mas apenas no segmento em que estabelece, para as coimas nele previstas aplicadas a pessoas singulares, um limite máximo superior ao fixado no regime geral do ilícito de mera ordenação social (artigo 17.º, n.º 1, do Decreto-Lei 433/82, de 17 de Outubro), por violação do artigo 168.º, n.º 1, alínea d), parte final, da Constituição.

Lisboa, 20 de Outubro de 1992. - Armindo Ribeiro Mendes - Messias Bento - Antero Alves Monteiro Dinis - Fernando Alves Correia - Vítor Nunes de Almeida - António Vitorino - Bravo Serra - Luís Nunes de Almeida - José de Sousa e Brito - Alberto Tavares da Costa - Maria da Assunção Esteves - José Manuel Cardoso da Costa.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/46735.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1951-08-07 - Decreto-Lei 38382 - Ministério das Obras Públicas - Gabinete do Ministro

    Aprova o Regulamento Geral das Edificações Urbanas, constante do presente diploma.

  • Tem documento Em vigor 1970-04-15 - Decreto-Lei 166/70 - Ministérios do Interior e das Obras Públicas

    Procede à reforma do processo de licenciamento municipal de obras particulares.

  • Tem documento Em vigor 1982-10-27 - Decreto-Lei 433/82 - Ministério da Justiça

    Institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

  • Tem documento Em vigor 1984-08-09 - Acórdão 56/84 - Tribunal Constitucional

    Declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, dos artigos 1.º, 2.º, n.os 1, 2 e 3, 3.º a 5.º, 6.º, n.os 1, 2, 3, 4, 5, 6, 8 e 9, 7.º, n.os 1 e 2, 8.º a 12.º e 27.º a 29.º do Decreto-Lei n.º 349-B/83, por violação dos artigos 168.º, n.º 1, alíneas c) e d), e 189.º, n.º 5, da Constituição.

  • Tem documento Em vigor 1985-11-04 - Decreto-Lei 463/85 - Ministério do Equipamento Social

    Dá nova redacção ao § único do artigo 5.º e aos artigos 161.º, 162.º, 163.º e 164.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38382, de 7 de Agosto de 1951. Revoga o n.º 3 do artigo 1.º e o n.º 6 do artigo 5.º e dá nova redacção ao n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 166/70, de 15 de Abril.

  • Tem documento Em vigor 1989-10-17 - Decreto-Lei 356/89 - Ministério da Justiça

    Introduz alterações ao Decreto Lei 433/82, de 27 de Outubro, que institui o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo.

Ligações para este documento

Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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