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Assento 6/95, de 10 de Outubro

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Sumário

SOB PENA DE ILEGITIMIDADE, POR SE TRATAR DE UM LITISCONSÓRCIO, DEVE SER PROPOSTA TAMBEM CONTRA O PROGENITOR QUE TENHA A SEU CARGO A GUARDA DO MENOR A ACÇÃO INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA NOVA REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL PARA ALTERAÇÃO DA PENSÃO DE ALIMENTOS DEVIDA AO MENOR PELO OUTRO PROGENITOR. (NUMERO 81043- PRIMEIRA SECCAO)

Texto do documento

Assento 6/95
N.º 81043 - 1.ª Secção
Acordam em tribunal pleno do Supremo Tribunal de Justiça:
I
1 - O Exmo. Magistrado do Ministério Público, ao abrigo do disposto nos artigos 776.º e 764.º do Código de Processo Civil, interpôs recurso para o tribunal pleno do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23 de Junho de 1988 proferido no processo de regulação do poder paternal n.º 8-A/84 do Tribunal Judicial de Viana do Castelo (recurso n.º 21837 daquela Relação, sumariado no Boletim do Ministério da Justiça, n.º 378, p. 783), com o fundamento de tal aresto estar em oposição com o Acórdão do mesmo Tribunal da Relação de 28 de Janeiro de 1988 proferido no processo de regulação do poder paternal n.º 99-A/88 (recurso n.º 22729 daquela Relação) também do Tribunal Judicial de Viana do Castelo, encontrando-se este acórdão publicado na Colectânea de Jurisprudência, ano XIII, t. I, p. 201.

Segundo o ilustre magistrado, a oposição reside no facto de, no primeiro aresto, se ter decidido que, pedindo o Ministério Público, em acção para nova regulação do poder paternal, apenas a alteração da prestação alimentícia a cargo de um dos progenitores fixada em anterior acção de alimentos, o outro progenitor é parte ilegítima, enquanto, no segundo, em idêntica situação, se decidiu em sentido contrário, por haver um litisconsórcio necessário passivo.

2 - Seguiu o processo os seus termos regulares.
A fls. 38 e seguintes, decidiu-se, por Acórdão de 12 de Maio de 1992, na questão preliminar, que havia oposição entre dois acórdãos sobre a mesma questão fundamental de direito, tendo ambos os acórdãos sido proferidos no domínio da mesma legislação, já que, durante o intervalo da sua prolação, não ocorreu qualquer modificação legislativa que interferisse, directa ou indirectamente, na questão de direito controvertida, sendo em ambos os acórdãos idêntica a situação de facto, já que o menor estava confiado aos cuidados da mãe e o devedor dos alimentos era o pai.

3 - A fls. 42 e seguintes encontram-se juntas as alegações do Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, nas quais se conclui com a proposta da formulação do assento a proferir.

O recorrido não contra-alegou.
II
1 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Previamente, há que referir, nos termos do n.º 3 do artigo 766.º do Código de Processo Civil, que existe a oposição de acórdãos reconhecida no acórdão da secção.

Em nenhum dos processos referidos era admissível recurso de revista ou de agravo para este Supremo Tribunal de Justiça por motivo estranho à alçada do tribunal [artigo 150.º da Organização Tutelar de Menores (Decreto-Lei 314/78, de 27 de Outubro) e n.º 3 do artigo 764.º do Código de Processo Civil], pelo que era admissível recurso para o Supremo, funcionando em tribunal pleno, dos dois acórdãos em oposição.

2 - De harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 182.º da Organização Tutelares de Menores, quando se torne necessário alterar o que estiver estabelecido, por acordo ou por decisão final, na regulação do poder paternal dos menores qualquer dos progenitores ou o curador podem requerer ao tribunal que no momento for territorialmente competente nova regulação do poder paternal.

A questão a decidir aqui é precisamente a de saber se, estando apenas um dos pais sujeito à prestação de alimentos ao menor, essa acção de alteração da regulação do poder paternal proposta pelo Ministério Público deve ser também intentada contra o outro pai.

No acórdão em que se decidiu pela ilegitimidade do progenitor não sujeito à prestação de alimentos argumentou-se que este progenitor não tinha interesse directo em contradizer, porque a sua esfera jurídica em nada podia ser atingida com a procedência do pedido, sendo, pelo contrário, esse progenitor sempre beneficiado com a condenação do requerido.

Ao invés, no outro acórdão em oposição considerou-se o seguinte: o único interesse directo em jogo na acção é o do menor que o Ministério Público representa, e não o da sua mãe, pelo que ambos os progenitores devem ser ouvidos sobre tudo o que lhe respeita (artigo 1878.º do Código Civil); a alteração da pensão de alimentos reflecte-se, ainda que indirectamente, no próprio progenitor que tem a seu cargo o menor. O processo é de jurisdição voluntária, pelo que o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, e verifica-se litisconsórcio necessário passivo porque, embora aparente e directamente nada se peça contra o progenitor que tem a seu cargo o menor, ele tem, na realidade, inequívoco e absoluto interesse na alteração, a qual se repercute na sua economia.

3 - Nos termos do n.º 1 do artigo 1878.º do Código Civil, compete a ambos os pais prover ao sustento dos filhos menores.

Nos casos de divórcio, separação de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento e na separação de facto dos pais, essa obrigação mantém-se (artigos 1905.º e 1909.º do Código Civil).

De harmonia com o disposto no n.º 3 do artigo 36.º da Constituição da República Portuguesa, «os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação dos filhos». Consagra-se aqui o princípio da igualdade dos cônjuges quanto a direitos e deveres.

Foi o Decreto-Lei 497/77, de 25 de Novembro, que veio harmonizar o Código Civil com a Constituição da República Portuguesa e no n.º 35 do seu preâmbulo explica a disciplina do exercício do poder paternal informado pelo princípio constitucional da igualdade dos cônjuges quanto aos poderes e deveres relativamente aos filhos.

Quando em nova regulação do poder paternal se vem pedir a alteração dos alimentos devidos ao filho menor de pais separados ou divorciados contra o progenitor que os presta, esse pedido pode ser formulado pelo outro progenitor ou pelo curador de menores (artigo 186.º da Organização Tutelares de Menores). Se a acção é proposta pelo curador, terá de ser intentada também contra o outro progenitor, porque a própria natureza da relação jurídica assim o exige para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal.

Com efeito, como os pais estão, e de igual modo, obrigados a alimentar os filhos menores, cada um deles tem um interesse directo na fixação do montante com que o outro contribuirá para esse fim, pois, quanto ao que cada um não dará nem poderá dar, terá o outro de suprir essa falta na medida das suas possibilidades.

Por outro lado, não se pode decidir nada quanto a qualquer conteúdo do poder paternal, sem que os seus dois titulares sejam demandados.

Mas há mais. Como a regulação do poder paternal foi decidida, tendo ambos os pais na acção como partes, é lógico que qualquer alteração só poderá ser tomada com os dois presentes como partes na nova acção.

Trata-se de um caso de litisconsórcio necessário passivo, nos termos do n.º 2 do artigo 28.º do Código de Processo Civil, pelo que a falta de intervenção na acção de um dos progenitores é motivo de ilegitimidade.

4 - Para o acórdão em que se decidiu a ilegitimidade do progenitor não sujeito à prestação de alimentos, o argumento ali usado foi o de que, nada sendo pedido contra ele, a sua esfera jurídica em nada podia ser atingida. Quer dizer, nesta visão do problema a legitimidade só poderia aferir-se pelo facto de ser dirigido um pedido contra alguém.

Mas esta não é a concepção legal, pois é o próprio artigo 26.º do Código de Processo Civil (onde se expressa o conceito de legitimidade) que nos diz que é do interesse em demandar ou em contradizer que deriva tanto a legitimidade activa como a passiva (seu n.º 1). O n.º 2 desse artigo 26.º refere que o interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da acção e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha.

E o progenitor não sujeito à prestação de alimentos podia sofrer prejuízos se não interviesse na acção, se não pudesse articular as razões quanto à fixação do novo montante de alimentos a pagar pelo outro progenitor ao filho menor de ambos.

O Prof. Antunes Varela diz-nos que a lei define a legitimidade (como poder de dirigir o processo) através da titularidade do interesse em litígio (Manual de Processo Civil, edição de 1984, p. 128).

E no caso trata-se de nova regulação do poder paternal quanto à fixação dos alimentos devidos pelo progenitor que não tem à sua guarda o menor. A regulação do poder paternal é da titularidade de ambos os pais e nada se pode decidir a este respeito sem serem ouvidos ambos.

5 - A alteração do regime estabelecido na regulação do poder paternal está prevista no artigo 182.º da Organização Tutelar de Menores e é uma das características dos processos de jurisdição voluntária (artigo 1411.º do Código de Processo Civil). E os processos tutelares cíveis são considerados de jurisdição voluntária (artigo 150.º da Organização Tutelar de Menores).

Mas o facto de se tratar de um processo de jurisdição voluntária em nada interfere nos pressupostos processuais, designadamente quanto à legitimidade das partes (artigos 1410.º e seguintes do Código de Processo Civil; Prof. Alberto dos Reis, Processos Especiais, vol. II, pp. 307 e seguintes).

6 - Como consequência do exposto, formula-se o seguinte assento:
Sob pena de ilegitimidade, por se tratar de um litisconsórcio, deve ser proposta também contra o progenitor que tenha a seu cargo a guarda do menor a acção intentada pelo Ministério Público para nova regulação do poder paternal para alteração da pensão de alimentos devida ao menor pelo outro progenitor;

7 - Este assento não tem influência alguma no acórdão recorrido.
Sem custas, nos termos do n.º 1 do artigo 37.º do Código das Custas Judiciais.
Lisboa, 4 de Julho de 1995. - Santos Monteiro (relator) - Oliveira Branquinho - Sá Ferreira (com a declaração de preferência pela redacção proposta pelo Exmo. Conselheiro Lopes Pinto) - Mário Cancela - Sampaio da Nóvoa - Costa Marques - Joaquim de Matos - Sousa Inês - Afonso de Melo - Lopes Rocha - Costa Soares - Metello de Nápoles - Correia de Sousa - Herculano Lima - Carvalho Pinheiro (com a declaração de preferência pela redacção proposta pelo Exmo. Conselheiro Lopes Pinto) - Araújo dos Anjos - Moura da Cruz (com a declaração de preferência pela redacção proposta pelo Exmo. Conselheiro Lopes Pinto) - Vaz dos Santos - Lopes Pinto (daria ao assento a seguinte redacção: «A alteração de pensão de alimentos devidos a menor pedida pelo Ministério Público deverá, por configurar litisconsórcio necessário, ser proposta contra ambos os progenitores.») - Cortez Neves - Ferreira Vidigal - Torres Paulo - Pedro Marçal - Miguel Montenegro - Figueiredo de Sousa - Fernando Fabião (vencido consoante declaração de voto que junto) - César Marques - Sá Nogueira - Roger Lopes - Ramiro Vidigal - Martins da Costa - Pais de Sousa - Miranda Gusmão (com a declaração de que daria ao assento a seguinte redacção: «A acção intentada pelo Ministério Público para nova regulação do poder paternal com vista à pensão de alimentos devida por um progenitor deve ser intentada contra ambos os progenitores, sob pena de legitimidade passiva.») - Sá Couto (com a declaração de voto do Exmo. Conselheiro Gusmão de Medeiros) - Silva Reis - Cardona Ferreira - Carlos Caldas (vencido pelas razões expostas pelo Exmo. Conselheiro Fernando Fabião).


Declaração de voto
Votei vencido, porque entendo que o progenitor não sujeito à prestação de alimentos é parte ilegítima na acção intentada pelo Ministério Público contra o outro progenitor, para alteração da prestação de alimentos devidos ao menor, pelas razões seguintes:

a) O réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer (artigo 26.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), interesse directo, frisa-se, e não meramente reflexo, e o progenitor a quem não é pedida a alteração da pensão alimentar não tem interesse directo em contradizer;

b) Aliás, um progenitor contra o qual nada é pedido e à guarda de quem presumivelmente estará o menor sempre poderá intervir no processo como assistente, ao lado do Ministério Público, nos termos do artigo 335.º do Código de Processo Civil;

c) Tanto o n.º 3 do artigo 182.º como o n.º 2 do artigo 187.º, ambos da Organização Tutelar de Menores, falam em requerido apenas, o que deixa adivinhar que do lado passivo da acção está apenas o progenitor obrigado à prestação alimentar, para além de que este último texto manda notificar para a conferência a pessoa que tiver o menor à sua guarda, se não for o autor, o que aponta no mesmo sentido e significa que o progenitor não obrigado à prestação alimentar também assiste à conferência;

d) O artigo 186.º, n.º 1, da Organização Tutelar de Menores admite que o progenitor a quem não é feito o pedido seja o requerente do processo como representante legal ou pessoa à guarda de quem o menor está, o que dá a entender que esse progenitor, a intervir, o faça do lado activo;

e) O julgador só poderá usar dos poderes conferidos pelo artigo 1410.º do Código de Processo Civil, ou seja, não obedecer aos critérios de legalidade estrita, se tal o impuser a conveniência ou a oportunidade em nome dos interesses do menor, mas, para tal, não há necessidade de violar o disposto sobre a legitimidade das partes no citado artigo 26.º do Código de Processo Civil.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/69854.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1977-11-26 - Decreto-Lei 497/77 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios da Administração Interna, das Finanças e dos Negócios Estrangeiros

    Altera o Decreto-Lei n.º 356/77, de 31 de Agosto, que estabelece disposições relativas à gestão do quadro geral de adidos.

  • Tem documento Em vigor 1978-10-27 - Decreto-Lei 314/78 - Ministério da Justiça

    Revê a Organização Tutelar de Menores.

Ligações para este documento

Este documento é referido no seguinte documento (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1995-11-29 - Rectificação 7/95 - Supremo Tribunal de Justiça

    RECTIFICA, POR TER SAÍDO COM INEXACTIDÃO, O ASSENTO NUMERO 6/95, DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, PUBLICADO NO DIÁRIO DA REPÚBLICA, NUMERO 234, DE 10 DE OUTUBRO DE 1995, PELO QUE NO NUMERO 6, ONDE SE LE 'POR SE TRATAR DE UM LITISCONSÓRCIO, DEVE SER' DEVE LER-SE 'POR SE TRATAR DE UM LITISCONSÓRCIO NECESSARIO, DEVE SER'.

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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