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Acórdão 598/99/T, de 20 de Março

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Texto do documento

Acórdão 598/99/T. Const. - Processo 804/97. - Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

1 - António Ribeiro Jorge Canastra recorreu para o Tribunal Constitucional do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2 de Outubro de 1997, "ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro", sustentando a inconstitucionalidade do "artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de Outubro [...], por ofender o princípio básico do contraditório", e dos "artigos 393.º e 394.º do Código de Processo Civil e [d]os artigos 1251.º, 1267.º, alínea b), e 1279.º do Código Civil", que "foram interpretados inconstitucionalmente, com violação do artigo 65.º, n.º 1, da Constituição - o direito à habitação: um cônjuge com duas habitações e o outro sem uma única casa -, brigando e afrontando também os princípios da igualdade e da proporcionalidade, em pleno arbítrio, discriminação familiar, sem peso nem medida - artigos 13.º e 18.º, n.º 2, da lei fundamental.

A ilegalidade e a inconstitucionalidade da interpretação dos referidos normativos foram problematizadas quando o podiam ser, designadamente nas alegações de 3 de Fevereiro de 1997, a fl. ..., onde o balanceamento da desigualdade entre os cônjuges foi devidamente equacionado e sopesado, bem como contra-alegado e ajuizado.

Sobressai a desigualdade entre o feminino e o masculino, inferiorizando e ridicularizando este até ao ponto de ficar sem o seu próprio lar. O desequilíbrio é confrangedor!".

O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2 de Outubro de 1997, a fl. 135, negou provimento ao recurso de agravo interposto por António Ribeiro Jorge Canastra da decisão do Tribunal Judicial da Comarca do Barreiro, que julgara procedente o pedido de restituição provisória da posse do imóvel, devidamente identificado nos autos, que constituía a casa de morada da família, formulado por sua mulher, Maria de Lurdes dos Santos Borges Canastra.

Para o que agora releva, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou que "não foram interpretados inconstitucionalmente os artigos 393.º e 394.º do Código de Processo Civil e 1251.º, 1267.º, alínea b), e 1279.º do Código Civil, com violação do artigo 65.º, n.º 1, da Constituição [...] [que] é uma norma programática, incumbindo ao Estado assegurar tal direito [à habitação], mediante políticas adequadas.

Não compete aos particulares e, consequentemente, à agravante assegurar tal direito."

Igualmente decidiu que o artigo 394.º do Código de Processo Civil (na versão anterior à reforma de 1997, introduzida pelo Decreto-Lei 329-A/95, de 12 de Dezembro), aplicável mesmo quando o imóvel cuja restituição provisória se pede é a casa de morada de família, por ter sido revogado o Decreto-Lei 293/77, de 20 de Julho, pela alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de Outubro, que "impõe que se ordene a restituição sem citação nem audiência do esbulhador", não ofende os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.

O recurso foi admitido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por despacho a fl. 146.

2 - Notificado para o efeito, o recorrente veio apresentar as respectivas alegações, concluindo da seguinte forma:

"Termos em que deve deliberar-se:

a) Julgar inconstitucional a norma do artigo 3.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de Outubro, por ofender o princípio do contraditório processual civil, no âmbito do contencioso familiar, em que é princípio assente que o tribunal deve tentar sempre a conciliação entre os cônjuges, no diálogo e no debate inter partes;

b) Julgar inconstitucional as normas dos artigos 393.º e 394.º do Código de Processo Civil e 1251.º, 1267.º, alínea b), e 1279.º do Código Civil, na interpretação antifamiliar que lhes foi encrostada pelo acórdão recorrido, por violação dos artigos 13.º, 18.º, n.º 2, 65.º, n.º 1, 66.º, n.º 1, e 67.º, n.º 1, da lei fundamental;

c) Consequentemente, conceder provimento ao recurso e revogar o acórdão recorrido, que deve ser reformado, de acordo com o aqui alegado sobre a questão de ilegalidade/inconstitucionalidade."

A recorrida não contra-alegou.

3 - Considerando não poder conhecer parcialmente do objecto do recurso, a relatora elaborou o parecer a fl. 175, que foi notificado às partes, e do qual se transcreve a parte relevante:

"Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 704.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 25.º do Decreto-Lei 329-A/95, de 12 de Dezembro, e no artigo 69.º da Lei 28/82, de 15 de Novembro, considero que o Tribunal Constitucional não pode conhecer parcialmente do objecto do presente recurso pelas seguintes razões:

1.ª Quanto ao recurso interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, por não ter sido invocada nenhuma das ilegalidades nela previstas;

2.ª Quanto à questão da inconstitucionalidade da norma constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de Outubro, por não ter sido alegada oportunamente. Com efeito, apenas foi suscitada no requerimento de interposição de recurso, sendo certo que a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82 exige que tenha sido levantada 'durante o processo', nos termos definidos pelo n.º 2 do artigo 72.º

c) Não tomar conhecimento da questão da inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 1251.º e 1267.º, alínea b), do Código Civil, por não terem sido aplicadas na decisão recorrida."

Nem o recorrente nem a recorrida responderam.

4 - Cumpre então conhecer do objecto do recurso, que, pelas razões constantes do parecer atrás referido, se circunscreve à alegada inconstitucionalidade das normas contidas nos artigos 393.º e 394.º do Código de Processo Civil, na sua anterior redacção, e 1279.º do Código Civil, cujo texto é o seguinte:

"Artigo 393.º

Em que casos tem lugar a restituição provisória de posse

No caso de esbulho violento, pode o possuidor pedir que seja restituído provisoriamente à sua posse, alegando os factos que constituem a posse, o esbulho e a violência.

Artigo 394.º

Termos em que a restituição é ordenada

Se o juiz reconhecer, pelo exame das provas, que o requerente tinha a posse e foi esbulhado dela violentamente, ordenará a restituição, sem citação nem audiência do esbulhador.

Artigo 1279.º

Esbulho violento

Sem prejuízo do disposto nos artigos anteriores, o possuidor que for esbulhado com violência tem o direito de ser restituído provisoriamente à sua posse, sem audiência do esbulhador."

Mesmo tendo em consideração que o bem cuja restituição foi ordenada no caso presente foi a casa de morada de família, em nada estas normas violam o direito à habitação, constitucionalmente tutelado pelo n.º 1 do artigo 65.º da Constituição. O recorrente, aliás, também não esclarece em que consistiria a alegada violação.

O artigo 65.º, como já por diversas vezes foi afirmado por este Tribunal (v., a título de exemplo, os Acórdãos n.os 101/92 e 346/93, publicados no Diário da República, 2.ª série, respectivamente de 18 de Agosto de 1992 e de 19 de Maio de 1994), tem por objectivo incumbir o Estado de uma série de tarefas destinadas a garantir que todos disponham, efectivamente, de uma habitação condigna e adequada. Do seu conteúdo obviamente programático não decorre - nem poderia decorrer, sob pena de impor um regime absurdo - que não possa ser aplicável à casa de morada de família a providência da restituição provisória da posse.

O recorrente coloca também a questão da violação, pelo disposto no artigo 394.º do Código de Processo Civil, do princípio do contraditório, por permitir que, em casos como o presente, se ordene a restituição provisória da posse da casa de morada de família sem audiência prévia do esbulhador.

É sabido que o princípio do contraditório é um dos princípios fundamentais do processo civil e que tem tutela constitucional. É uma exigência clara do princípio da igualdade das partes, por sua vez manifestação do princípio da igualdade perante a lei e do próprio Estado de direito.

Isso não significa, porém, que não existam situações em que ele tem de ceder face à necessidade de eficácia de determinadas medidas judiciais, inoperantes se precedidas de audiência da parte contra quem são requeridas. É o que, em geral, sucede com a justiça cautelar (cf., nomeadamente, o Acórdão 739/98, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 8 de Março de 1998), onde se integra a providência da restituição provisória da posse, cuja constitucionalidade não se vê que possa ser posta em crise, salvo se for manifestamente desproporcionado o sacrifício do contraditório.

Não é, porém, o caso, pois que a restituição da posse só é ordenada se o tribunal, julgada a prova admissível (oferecida pelo requerente ou ordenada pelo juiz, oficiosamente), concluir pela existência de esbulho violento.

Não são, pois, inconstitucionais as normas impugnadas pelo recorrente.

Assim, decide-se:

a) Não tomar conhecimento do recurso interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei 28/82, por não ter sido invocada nenhuma das ilegalidades nela previstas;

b) Não tomar conhecimento da questão da inconstitucionalidade da norma constante da alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei 321-B/90, de 15 de Outubro, por não ter sido suscitada oportunamente;

c) Não tomar conhecimento da questão da inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 1251.º e 1267.º, alínea b), do Código Civil, por não terem sido aplicadas na decisão recorrida;

d) Não julgar inconstitucionais as normas constantes dos artigos 393.º e 394.º do Código de Processo Civil, na versão anterior à reforma, introduzida pelo Decreto-Lei 329-A/95, de 12 de Dezembro;

e) Não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 1279.º do Código Civil.

Consequentemente, nega-se provimento ao recurso, na parte em que se toma conhecimento do seu objecto.

Lisboa, 2 de Novembro de 1999. - Maria dos Prazeres Beleza - Messias Bento - José de Sousa e Brito - Alberto Tavares da Costa - Luís Nunes de Almeida.

Anexos

  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/1764003.dre.pdf .

Ligações deste documento

Este documento liga aos seguintes documentos (apenas ligações para documentos da Serie I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1977-07-20 - Decreto-Lei 293/77 - Ministério da Justiça

    Introduz alterações ao regime das acções de despejo.

  • Tem documento Em vigor 1982-11-15 - Lei 28/82 - Assembleia da República

    Aprova a organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional - repete a publicação, inserindo agora a referenda ministerial.

  • Tem documento Em vigor 1990-10-15 - Decreto-Lei 321-B/90 - Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

    Aprova o regime do arrendamento urbano.

  • Tem documento Em vigor 1995-12-12 - Decreto-Lei 329-A/95 - Ministério da Justiça

    Revê o Código de Processo Civil. Altera o Código Civil e a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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