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Lei 68/78, de 16 de Outubro

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Sumário

Define a lei orgânica das empresas em autogestão.

Texto do documento

Lei 68/78

de 16 de Outubro

Empresas em autogestão

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea d) do artigo 164.º e n.º 2 do artigo 169.º da Constituição, o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

ARTIGO 1.º

1 - O presente diploma aplica-se às empresas e estabelecimentos comerciais, industriais, agrícolas ou pecuárias em que, por uma evolução de facto não regularizada ainda nos termos gerais de direito, os trabalhadores assumiram a gestão entre 25 de Abril de 1974 e a data da entrada em vigor da presente lei, sob forma cooperativa, autogestionária ou qualquer outra, tenham ou não sido credenciados por qualquer Ministério.

2 - O presente diploma não se aplica às empresas e estabelecimentos referidos no número anterior, em relação aos quais:

a) A situação sempre haja sido juridicamente regular ou se encontre actualmente regularizada, nos termos gerais de direito;

b) A situação jurídica tenha sido definida por decisão judicial com trânsito em julgado, não meramente cautelar, à data de entrada em vigor do presente diploma.

3 - O termo «autogestão», no presente diploma, abrange as situações descritas no n.º 1 deste artigo.

ARTIGO 2.º

1 - A autogestão é litigiosa quando há oposição do proprietário, singular ou colectivo, da empresa ou do estabelecimento.

2 - A autogestão é viciada quando se constituiu ou manteve por actos graves ou censuráveis, designadamente de violência ou fraude.

3 - A autogestão é justificada, nomeadamente:

a) Quando, no momento da sua constituição, se verificavam os pressupostos da falência fraudulenta;

b) Quando, por culpa do proprietário, ficou comprometida gravemente a viabilidade económica da empresa ou do estabelecimento;

c) Quando o proprietário revelou manifesto desinteresse equivalente ao abandono.

4 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a autogestão será considerada injustificada quando, ponderadas as circunstâncias de cada caso, não se poderia razoavelmente exigir do empresário normal que se mantivesse à frente da sua empresa ou estabelecimento na altura em que se iniciou a autogestão.

ARTIGO 3.º

Em virtude da situação de autogestão, delimitados e inventariados os bens da empresa, será posteriormente confirmada a posse útil e a gestão desta ao colectivo de trabalhadores da mesma, sob a tutela do Instituto Nacional das Empresas em Autogestão, adiante abreviadamente designado por INEA, mantendo o proprietário da empresa ou estabelecimento a nua-titularidade até se regularizar a respectiva situação.

CAPÍTULO II

Delimitação e investigação dos bens da empresa

ARTIGO 4.º

Ficam sujeitos à situação jurídica regulada neste diploma todos os bens ou direitos do proprietário da empresa ou estabelecimento que no momento da constituição da autogestão se encontravam afectos à prossecução do seu objecto e os que dela tenham sido desafectados por acto não conforme com uma gestão normal.

ARTIGO 5.º

1 - Constituindo a empresa ou o estabelecimento a parte essencial do património de uma sociedade, aplica-se o regime dos números seguintes.

2 - Se houver bens ou documentos da empresa ou do estabelecimento em poder de algum titular de órgão da sociedade, dos trabalhadores ou de terceiros, devem os mesmos entregá-los à comissão de gestão, sob pena de responderem pelos prejuízos que causarem.

3 - Não os entregando espontaneamente, ou apesar de interpelados para o fazerem em prazo razoável, pode a comissão de gestão da empresa, em acção de processo comum, exigir em juízo ou a sua entrega ou o respectivo valor, à escolha da mesma comissão.

ARTIGO 6.º

1 - O tribunal, a pedido da comissão de gestão da empresa ou do proprietário, pode, quanto aos bens que não estivessem exclusivamente afectados à prossecução do objecto da empresa, partilhá-los ou regular o seu uso segundo a equidade.

2 - Quando não seja possível a aplicação do número anterior, manterá a posse quem estiver na detenção dos bens à data da entrada em vigor do presente diploma, excepto se houver obtido essa detenção por meios violentos ou fraudulentos.

ARTIGO 7.º

Tratando-se de empresa pertencente a pessoa singular, aplica-se, com as necessárias adaptações, o regime dos artigos anteriores aos bens que daquela tenham sido anormalmente desafectados e se encontrem na posse do seu proprietário, dos trabalhadores ou de terceiros.

ARTIGO 8.º

O regime dos artigos anteriores aplicar-se-á, com as necessárias adaptações, ao caso de várias empresas ou estabelecimentos pertencentes a um mesmo proprietário, individual ou colectivo, ou de empresa ou estabelecimento pertencente a uma pessoa colectiva que não seja sociedade.

ARTIGO 9.º

1 - No prazo de sessenta dias a contar da publicação da presente lei, deverá proceder-se à elaboração de dois inventários da empresa ou do estabelecimento, reportando-se o primeiro à data do início da autogestão e o segundo à data da sua elaboração.

2 - Além dos inventários mencionados no número anterior, o património da empresa ou do estabelecimento será anualmente inventariado até 31 de Março do ano seguinte àquele a que disser respeito.

3 - As cópias dos inventários referidos nos números anteriores serão enviadas ao INEA e aos proprietários nos quinze dias imediatos à sua conclusão.

4 - O INEA, além de poder fiscalizar a exactidão dos inventários, poderá mandar proceder, ou proceder ele próprio, por sua iniciativa ou a pedido do proprietário, a inventários intercalares com a periodicidade que achar conveniente.

CAPÍTULO III

Situação jurídica de autogestão

SECÇÃO I

Preliminares

ARTIGO 10.º

1 - Até à regularização definitiva da sua situação, nos termos do artigo 38.º as empresas em autogestão são dotadas de autonomia patrimonial plena e de personalidade judiciária.

2 - Durante o período referido no número anterior, presume-se a carência económica das empresas em autogestão, para o efeito, entre outros, de se lhes atribuir o benefício da assistência judiciária.

3 - Nas empresas em autogestão a posse útil e a gestão distinguir-se-ão da nua-titularidade, nos termos dos artigos seguintes.

4 - As empresas em autogestão são tuteladas pelo Governo através do Instituto Nacional das Empresas em Autogestão (INEA).

SECÇÃO II

Posse útil e gestão da empresa ou do estabelecimento

SUBSECÇÃO I

Posse útil

ARTIGO 11.º

1 - A posse útil da empresa ou do estabelecimento compreende a detenção e fruição de todos os bens a ela afectos e a possibilidade de exigência daqueles que não detenha, nos termos dos artigos 4.º a 7.º deste diploma.

2 - A posse útil referida no número anterior é tutelada por todos os meios facultados ao possuidor pelos artigos 1276.º e seguintes do Código Civil, que podem ser utilizados mesmo contra o proprietário.

ARTIGO 12.º

1 - A posse útil da empresa ou do estabelecimento, durante a autogestão, cabe ao colectivo dos trabalhadores permanentes da mesma, em contitularidade, ou, se assim se organizarem, à pessoa colectiva.

2 - A posse útil é intransmissível, não conduz à usucapião e não confere o direito de dar em locação o estabelecimento, salvo quanto à locação parcial, mediante prévia autorização, por escrito, do INEA.

3 - Se não for autorizada pelo empresário a locação a que se refere o número anterior, poderá cessar por mera vontade deste, no caso de lhe ser restituída a posse útil e a gestão da empresa.

ARTIGO 13.º

Em tudo o que não esteja regulado neste diploma, nem seja contrariado pelo que nele se dispõe, aplicam-se, ressalvadas as necessárias adaptações, as regras relativas ao usufruto.

SUBSECÇÃO II

Gestão

DIVISÃO I

Agentes de gestão

ARTIGO 14.º

A administração das empresas ou estabelecimento em autogestão cabe ao colectivo dos seus trabalhadores permanentes, que a exercerá obrigatoriamente através de uma comissão de gestão eleita.

ARTIGO 15.º

1 - Os gestores serão eleitos e exonerados em plenário do colectivo dos trabalhadores, convocado expressa e exclusivamente para esse efeito com a antecedência mínima de quinze dias, por voto directo e secreto, só sendo válida a sua eleição ou exoneração quando efectuada à pluralidade de votos e com a presença da maioria dos membros do colectivo.

2 - O plenário do colectivo dos trabalhadores elaborará o regulamento da eleição e sujeitá-lo-á a homologação do INEA.

3 - De igual homologação, restrita à fiscalização das disposições legais e regulamentares, carecem a eleição e a exoneração. Para o efeito deverão ser elaboradas e enviadas ao INEA uma folha de presenças, devidamente assinada pelos trabalhadores presentes, e uma acta, assinada pelos membros da mesa do plenário, de que conste fielmente tudo quanto na reunião se tiver passado.

4 - Dentro do prazo de dez dias, a contar do acto eleitoral ou de exoneração, poderá qualquer membro do colectivo dos trabalhadores reclamar junto do INEA contra qualquer irregularidade que julgue verificada.

5 - Do despacho de homologação, ou da sua recusa, constará a identificação dos gestores eleitos, considerando-se estes automaticamente em exercício, sem dependência de acto de posse, a partir da notificação daquele despacho.

6 - A recusa da homologação implica a obrigatoriedade de repetição do acto eleitoral dentro do prazo de sessenta dias.

7 - Os gestores são eleitos pelo prazo de dois anos, sem prejuízo do direito de exoneração a todo o tempo, podendo ser reeleitos por uma ou mais vezes.

ARTIGO 16.º

1 - Verificando-se duas recusas, ou não se tendo procedido a eleição válida e regular, o INEA nomeará, pelo prazo de seis meses, renovável por iguais períodos, uma comissão administrativa, que terá todos os poderes que teria a comissão de gestão regularmente eleita.

2 - É dever da comissão administrativa envidar todos os esforços para regularizar a situação da empresa.

ARTIGO 17.º

1 - A comissão de gestão terá um mínimo de três e um máximo de sete membros.

2 - Se o INEA considerar excessivo o número de membros da comissão eleita, este poderá ser por ele reduzido, depois de ouvidos os trabalhadores.

ARTIGO 18.º

Os membros da comissão de gestão serão, normalmente, trabalhadores permanentes da empresa, mas poderão deixar de o ser quando o colectivo dos trabalhadores assim o queira, ou quando razões ponderosas o aconselhem, designadamente a necessidade de especiais conhecimentos técnicos.

ARTIGO 19.º

1 - A remuneração dos gestores será fixada pelo INEA, sob proposta do colectivo dos trabalhadores.

2 - Em caso de autogestão litigiosa ou viciada, a remuneração não pode, durante a autogestão, exceder em mais de 20% a do trabalhador da empresa que aufira melhor retribuição.

ARTIGO 20.º

1 - Dos gestores eleitos o colectivo dos trabalhadores escolherá um para presidente da comissão de gestão, o qual terá voto de qualidade em caso de empate.

2 - A empresa só se considerará obrigada pela assinatura conjunta de dois membros da comissão de gestão.

3 - A comissão de gestão poderá, por seu turno, constituir mandatários, que obrigarão a empresa no âmbito do respectivo mandato.

ARTIGO 21.º

As comissões de gestão deverão operar em estreita colaboração com o INEA e os seus membros respondem pelos seus actos nos mesmos termos de administradores e gerentes de qualquer sociedade comercial.

ARTIGO 22.º

1 - Em caso de grave ou de repetido incumprimento das suas obrigações legais ou estatutárias, ou de manifesta incompetência para o exercício da gestão, o INEA poderá exonerar, após a sua audição prévia e a do plenário do colectivo dos trabalhadores, qualquer comissão de gestão ou apenas um ou mais dos respectivos membros.

2 - Proferida a decisão exoneratória, da qual caberá recurso para o Primeiro-Ministro, com efeito meramente devolutivo, será a mesma levada ao conhecimento do presidente da mesa do plenário do colectivo dos trabalhadores, para o efeito de se proceder a nova eleição dos membros que hão-de substituir os gestores exonerados, dentro do prazo que para o efeito for fixado pelo INEA.

3 - O mandato dos gestores exonerados findará com a entrada em funções dos novos gerentes eleitos, salvo quando o INEA impuser a cessação imediata, neste caso dispondo sobre a gestão interina da empresa.

ARTIGO 23.º

O INEA promoverá a publicação, no Diário da República, e o registo, na Conservatória do Registo Comercial, dos elementos de identificação das empresas em autogestão e dos membros das respectivas comissões de gestão.

DIVISÃO II

Normas de gestão

ARTIGO 24.º

1 - Os colectivos de trabalhadores e as comissões de gestão devem obediência, na parte que não resulte afastada por este diploma, aos preceitos da lei geral aplicável.

2 - Em matéria de gestão ou de fiscalização da empresa ou estabelecimento autogerido, a competência legal e estatutária dos órgãos da pessoa colectiva sujeito da nua-titularidade dessa empresa ou estabelecimento, com excepção do órgão normal de gestão, é exercida pelo INEA, que dela fará uso prudente, com observância do disposto na lei e nos estatutos respectivos.

ARTIGO 25.º

As comissões de gestão enviarão ao INEA e ao proprietário relatórios trimestrais da situação económica e financeira das respectivas empresas, bem como todas as informações que pelo INEA lhe forem solicitadas.

ARTIGO 26.º

A gestão das empresas, durante a situação provisória regulada neste diploma, será exercida em benefício da própria empresa e da economia nacional.

ARTIGO 27.º

1 - Carecem de autorização, por escrito, do INEA, ouvido o proprietário, sob pena de nulidade, os actos que os estatutos façam depender de aprovação pela assembleia geral ou de sócios, ou de parecer favorável do órgão de fiscalização, bem como os que não sejam de mera administração corrente da empresa, designadamente:

a) Os actos de disposição de bens de património da empresa, cuja função normal, nesse património, não seja o de serem alienados;

b) Os actos a título gratuito, mesmo usuais e remuneratórios.

2 - Da decisão do INEA cabe sempre acção de recurso a propor nos tribunais comuns pela comissão de gestão da empresa ou pelo proprietário, para anulação ou suprimento da decisão do INEA, com efeitos suspensivos e tendo em conta os interesses da empresa ou do estabelecimento.

3 - A acção prevista no número anterior deverá ser proposta no prazo de trinta dias, a contar do conhecimento pelos interessados, da decisão do INEA.

ARTIGO 28.º

1 - A comissão de gestão pode dispor, nos termos usuais do comércio, dos bens cujo destino normal seja a alienação.

2 - A celebração de contratos de valor superior ao montante a definir, para cada empresa, pelo INEA, ficará sujeita às regras que este entender necessárias.

3 - No caso de as regras previstas no número anterior sujeitarem a validade dos contratos nele mencionados a autorização prévia do INEA, esta considerar-se-á concedida se não se pronunciar dentro do prazo de dez dias, a contar do recebimento do respectivo pedido.

ARTIGO 29.º

1 - Os lucros da empresa ou do estabelecimento em autogestão provisória, depois de constituídos os necessários fundos de reserva, serão distribuídos pelos trabalhadores, de acordo com as regras a este propósito fixadas pelo colectivo dos trabalhadores e previamente homologadas pelo INEA.

2 - Não haverá, todavia, distribuição de lucros enquanto o valor do património líquido da empresa ou do estabelecimento não for superior ao valor existente no momento em que se inicia a autogestão.

3 - No caso de a autogestão terminar em virtude de a empresa ou estabelecimento ser entregue ao proprietário, ou por expropriação, os trabalhadores terão direito a receber os lucros acumulados na empresa ou estabelecimento, correspondentes à diferença entre o valor patrimonial líquido apurado no momento em que terminou e no momento em que começou a autogestão.

4 - O direito referido no número anterior não será reconhecido aos trabalhadores, porém, no caso de autogestão viciada.

SECÇÃO III

Nua-titularidade

ARTIGO 30.º

Durante a situação de autogestão provisória da empresa ou do estabelecimento, prevista neste diploma, o proprietário individual ou colectivo dos mesmos mantém a nua-titularidade do seu direito.

ARTIGO 31.º

1 - A nua-titularidade confere ao seu titular as seguintes faculdades:

a) A de recuperar a plenitude dos seus direitos cessada a situação de autogestão, salvo se a cessação implicar outros efeitos jurídicos;

b) A de ser indemnizado, nos termos gerais de direito, se for privado da nua-titularidade, salvo nos casos de autogestão justificada nos termos do artigo 2.º;

c) A de denunciar ao INEA quaisquer irregularidades cometidas na ou pela empresa, no ou pelo estabelecimento, devendo o INEA investigá-las e comunicar-lhe fundamentadamente os resultados da investigação;

d) A de solicitar em juízo, em acção de processo comum proposta contra o colectivo de trabalhadores representado pela comissão de gestão em exercício, a qualificação da autogestão, nos termos do artigo 2.º, para efeitos da definição do respectivo regime;

e) A de solicitar ao INEA que lhe seja fixada uma renda mensal, a pagar pela empresa ou pelo estabelecimento, no caso de carecer dela para assegurar a satisfação das suas necessidades essenciais ou do seu agregado familiar. Da decisão do INEA cabe recurso para o tribunal por parte do proprietário ou da comissão de gestão da empresa ou do estabelecimento.

2 - A denúncia prevista na alínea c) do número anterior pode ser considerada caluniosa para efeitos de incriminação.

3 - Na acção prevista na alínea d) do n.º 1 deste artigo será sempre ouvido o Ministério Público, em representação do INEA.

4 - No caso da alínea e) do n.º 1 deste artigo, o montante não pode exceder o que o titular poderia legal e razoavelmente esperar auferir em situação de gestão normal.

ARTIGO 32.º

1 - Sendo o proprietário uma pessoa colectiva cujo património fosse essencialmente constituído pela empresa ou pelo estabelecimento, tal pessoa colectiva subsiste apenas e unicamente em função da nua-titularidade pelo que à empresa autogerida diz respeito, suspendendo-se os direitos e obrigações estranhos à referida titularidade.

2 - A qualquer sócio ou associado da pessoa colectiva cabem os direitos previstos nas alíneas a), b), c) e e) do n.º 1 do artigo anterior, na justa medida da sua participação no capital social.

ARTIGO 33.º

É lícita a disposição entre vivos ou por morte da nua-titularidade e das partes sociais de pessoas colectivas, nos termos da lei e respectivos estatutos.

CAPÍTULO IV

Direitos de terceiros

ARTIGO 34.º

A autogestão não prejudica os direitos de terceiros, com ressalva do disposto nos artigos seguintes.

ARTIGO 35.º

1 - Se o titular da nua-titularidade da empresa ou do estabelecimento tiver um património distinto daquela, distinguir-se-ão também, nos termos dos números seguintes, as dívidas decorrentes da aquisição e exploração da empresa ou do estabelecimento e as dívidas decorrentes de outra causa.

2 - Durante a autogestão, os credores por dívidas decorrentes da aquisição e exploração da empresa ou do estabelecimento só a estes podem demandar e só pelos bens a ela afectos podem fazer-se pagar.

3 - Durante a autogestão, os credores por dívidas pessoais do proprietário não podem fazer-se pagar por bens da empresa ou do estabelecimento.

ARTIGO 36.º

Durante a autogestão, as garantias pessoais prestadas anteriormente por dívidas decorrentes da aquisição e exploração da empresa ou do estabelecimento não podem ser invocadas pelos credores.

ARTIGO 37.º

Durante a autogestão provisória ficam suspensas todas as acções executivas contra empresas individuais ou colectivas em que os trabalhadores tenham assumido a gestão e que visem o pagamento de dívidas contraídas anteriormente à data do início da autogestão ou emergentes de actos anteriores à mesma data.

CAPÍTULO V

Regularização definitiva da autogestão

SECÇÃO I

Preliminares

ARTIGO 38.º

A autogestão contemplada neste diploma dará lugar a uma das seguintes situações:

a) Definição da situação do proprietário;

b) Aquisição pelo Estado da propriedade plena da nua-titularidade da empresa ou do estabelecimento;

c) Aquisição pelo colectivo dos trabalhadores da nua-titularidade da empresa ou do estabelecimento.

SECÇÃO II

Definição da situação do proprietário

ARTIGO 39.º

1 - A situação do proprietário define-se:

a) Por acordo entre o proprietário e o colectivo dos trabalhadores, homologado pelo INEA;

b) Pelo decurso do prazo de cento e vinte dias, a contar da data de entrada em vigor do presente diploma, sem que tenha sido por ele intentada acção de reivindicação da empresa ou do estabelecimento ou da restituição da sua posse;

c) Por decisão judicial proferida em acção intentada dentro do prazo referido na alínea anterior;

d) Por expropriação da empresa ou do estabelecimento ou da nua-titularidade sobre a mesma.

2 - O acordo previsto na alínea a) do número anterior revestirá, sob pena de nulidade, a forma de escritura pública, devendo ser assinado pelo proprietário, ou quem o represente, e pela comissão de gestão mandatada expressamente pelo plenário dos trabalhadores, ou quem a represente, e será inscrito no registo comercial.

3 - O acordo referido na alínea a) do n.º 1 deste artigo deve estabelecer todos os direitos e obrigações reciprocamente assumidos pelo proprietário e pelos trabalhadores até ao momento da cessação da autogestão, não sendo lícito a nenhuma das partes exigir indemnizações, benfeitorias, salários ou quaisquer verbas não previstos no acordo.

4 - O acordo pode, nomeadamente, fixar o destino dos lucros, se os houver, devendo, em caso de silêncio a esse respeito, ser distribuídos pelos trabalhadores, nos termos do n.º 1 do artigo 29.º

ARTIGO 40.º

1 - Os proprietários das empresas ou estabelecimentos em autogestão podem reivindicá-los ou pedir a restituição da sua posse dentro do prazo referido na alínea b) do n.º 1 do artigo anterior, em acção movida contra o próprio colectivo de trabalhadores, representado pela comissão de gestão em exercício, na qual será ouvido o INEA, que, após notificação inicial, passará a ser representado pelo Ministério Público.

2 - O pedido nas acções referidas no número anterior será julgado improcedente provando-se que a autogestão foi justificada, nos termos dos n.os 3 e 4 do artigo 2.º 3 - As acções referidas no n.º 1 admitem sempre o recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça, independentemente do seu valor.

ARTIGO 41.º

Exercido com êxito pelos proprietários de empresas autogeridas o direito à restituição da respectiva posse, cessa automaticamente a posse útil pelo colectivo dos seus trabalhadores, terminando a gestão por este colectivo logo que se encontrem designados por aqueles os novos gestores.

ARTIGO 42.º

A oposição à efectiva restituição de posse e à substituição na gestão, em todos os casos em que devam ter lugar, faz incorrer os responsáveis em pena de prisão até dois anos e, em regime de solidariedade passiva, na responsabilidade civil conexa.

SECÇÃO III

Aquisição pelo Estado

SUBSECÇÃO I

Preliminares

ARTIGO 43.º

A aquisição pelo Estado pode resultar de:

a) Expropriação da empresa ou do estabelecimento ou só da nua-titularidade destes;

b) Caducidade do direito a reivindicar a empresa ou o estabelecimento ou a exigir a restituição da sua posse;

c) Acordo com o proprietário.

SUBSECÇÃO II

Expropriação

ARTIGO 44.º

1 - O Estado pode pôr termo à autogestão, expropriando a empresa ou o estabelecimento, nos termos gerais de direito, sob proposta fundamentada do INEA, do colectivo de trabalhadores ou dos proprietários da nua-titularidade.

2 - A posse útil não confere direito a qualquer indemnização, mas o colectivo dos trabalhadores da empresa é parte no processo de expropriação.

ARTIGO 45.º

1 - O Estado pode, nas mesmas condições do artigo anterior, expropriar apenas a nua-titularidade.

2 - A partir desse momento consolida-se a posse útil e a gestão pelo colectivo de trabalhadores, considerando-se a empresa ou o estabelecimento em autogestão definitiva.

ARTIGO 46.º

À autogestão definitiva aplica-se, em princípio, o que se estabelece neste diploma para a autogestão não litigiosa, não viciada e justificada, salvas as adaptações necessárias, designadamente a possibilidade de fixação pelo INEA de um prazo de duração da posse útil e da autogestão, automaticamente renovável, em termos a determinar também pelo INEA.

SUBSECÇÃO III

Caducidade ARTIGO 47.º

1 - O direito de reivindicar a empresa ou de exigir judicialmente a restituição da sua posse caduca decorridos cento e vinte dias sobre a entrada em vigor do presente diploma.

2 - Verificando-se a caducidade do direito a reivindicar a empresa ou a exigir a restituição da sua posse ou o decaimento nas mesmas acções, a nua-titularidade transfere-se para o Estado.

SECÇÃO IV

Aquisição da nua-titularidade pelo colectivo de trabalhadores

ARTIGO 48.º

Os trabalhadores podem adquirir a nua-titularidade da empresa ou do estabelecimento por acordo com o proprietário, homologado pelo INEA, ou por acordo com o Estado, para o efeito representado pelo INEA, quando a nua-titularidade lhe pertencer.

ARTIGO 49.º

A partir da aquisição da nua-titularidade pelo colectivo dos trabalhadores, tornam-se definitivas as situações constantes dos artigos 35.º e 36.º deste diploma.

ARTIGO 50.º

1 - A aquisição ao Estado prevista no artigo 48; efectivar-se-á pelo justo preço da universalidade dos bens, direitos e obrigações transmitidos, podendo deixar de ser incluídos na cessão alguns dos elementos activos ou passivos do respectivo estabelecimento.

2 - O justo preço será o que como tal for considerado pelo INEA, após avaliação feita com intervenção de um representante dos trabalhadores, mas, para que a cessão se efective, terão as suas principais condições, nomeadamente o preço, o prazo, a forma e as garantias do pagamento, de ser previamente aprovadas pelo Conselho de Ministros.

CAPÍTULO VII

Disposições finais e transitórias

ARTIGO 51.º

1 - No decurso da autogestão provisória de qualquer empresa ou estabelecimento não poderá ser requerida a falência nem acordada a dissolução da correspondente pessoa jurídica sem prévio assentimento, por escrito, do INEA.

2 - Quando o assentimento do INEA à declaração da falência seja solicitado por um credor da empresa ou estabelecimento, o INEA, em caso de recusa, poderá adquirir, pelo justo preço e como litigioso, o direito do mesmo credor, ficando sub-rogado na posição deste em relação à empresa ou estabelecimento devedores.

ARTIGO 52.º

Dentro do prazo de trinta dias, a contar da entrada em vigor do presente diploma, sem prejuízo de dilação concedida pelo INEA, devem os colectivos dos trabalhadores das empresas ou dos estabelecimentos em autogestão:

a) Proceder à eleição da mesa do respectivo plenário e da comissão de gestão, após elaboração e homologação do respectivo regulamento eleitoral;

b) Propor ao INEA a remuneração dos membros da respectiva comissão de gestão.

ARTIGO 53.º

Com a homologação da eleição das comissões de gestão previstas no artigo 15.º cessarão automaticamente as funções dos actuais gestores em exercício.

ARTIGO 54.º

A transferência da posse útil e da gestão para o colectivo dos trabalhadores, nos termos deste diploma, implica a ratificação dos actos dos trabalhadores que exerceram de facto a gestão, credenciados ou não, sem prejuízo da responsabilidade penal e civil em que eventualmente tenham incorrido, nos termos gerais do direito.

ARTIGO 55.º

1 - Nenhuma acção que tenha por objecto principal ou acessório a restituição de empresas ou estabelecimentos em autogestão poderá ter seguimento sem prévia audiência do colectivo dos seus trabalhadores, representado pela comissão de gestão, do Ministério Público e do INEA.

2 - Sem prejuízo do disposto no artigo 37.º as acções pendentes com o fim de reivindicar ou por qualquer forma obter a restituição de posse de empresas em autogestão converter-se-ão em acções propostas contra o colectivo dos trabalhadores, representado pela comissão de gestão em exercício, com processo comum, e retomarão o seu curso dando-se cumprimento ao disposto no artigo 40.º

ARTIGO 56.º

Enquanto não entrar em funções o INEA, a competência deste, prevista neste diploma, será exercida pelos actuais Ministérios de Tutela.

Aprovada em 15 de Junho de 1978.

O Presidente da Assembleia da República, Vasco da Gama Fernandes.

Promulgada em 14 de Setembro de 1978.

Publique-se.

O Presidente da República, ANTÓNIO RAMALHO EANES. - O Primeiro-Ministro, Alfredo Jorge Nobre da Costa.

Anexos

  • Texto integral do documento: https://dre.tretas.org/pdfs/1978/10/16/plain-159322.pdf ;
  • Extracto do Diário da República original: https://dre.tretas.org/dre/159322.dre.pdf .

Ligações para este documento

Este documento é referido nos seguintes documentos (apenas ligações a partir de documentos da Série I do DR):

  • Tem documento Em vigor 1979-11-17 - Decreto-Lei 453/79 - Ministérios das Finanças e da Indústria

    Torna extensivo às cooperativas de actividade industrial o Decreto-Lei n.º 124/77, de 1 de Abril.

  • Tem documento Em vigor 1980-10-08 - Decreto-Lei 451/80 - Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios da Justiça e do Trabalho

    Estabelece normas relativas às empresas em autogestão restituídas aos respectivos titulares.

  • Tem documento Em vigor 1981-06-30 - Decreto-Lei 181/81 - Ministérios da Justiça e da Indústria e Energia

    Concede a presunção de carência económica aos titulares de empresas em autogestão, designadamente para o efeito de lhes atribuir o benefício de assistência judiciária.

  • Não tem documento Em vigor 1989-07-31 - ASSENTO DD61 - SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    Uniformiza a seguinte jurisprudência: o abandono definitivo de uma empresa pelos seus trabalhadores em autogestão antes da vigência da Lei nº 68/78, de 16 de Outubro, põe fim a essa autogestão e torna invocáveis as garantias referidas no artigo 36.º da mesma lei.

  • Tem documento Em vigor 1989-07-31 - Assento - Supremo Tribunal de Justiça

    O abandono definitivo de uma empresa pelos seus trabalhadores em autogestão antes da vigência da Lei n.º 68/78, de 16 de Outubro, põe fim a essa autogestão e torna invocáveis as garantias referidas no artigo 36.º da mesma lei

  • Tem documento Em vigor 1990-06-01 - Acórdão 136/90 - Tribunal Constitucional

    Declara inconstitucionais, com força obrigatória geral, a norma da alínea c) do n.º 4 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 267/80, de 8 de Agosto, que aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia Regional dos Açores, e, por violação dos artigos 50.º, n.º 3, e 18.º, n.º 2, da Constituição, a norma do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 318-D/76, de 30 de Abril, que aprova o Estatuto Provisório da Região Autónoma da Madeira, na parte em que, além da residência habitual que é exigida no território da Região, exige ainda qu (...)

Aviso

NOTA IMPORTANTE - a consulta deste documento não substitui a leitura do Diário da República correspondente. Não nos responsabilizamos por quaisquer incorrecções produzidas na transcrição do original para este formato.

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